domingo, 29 de abril de 2012

NADA SEM AMOR

A inteligência sem amor, faz-te perverso.

A justiça sem amor, faz-te implacável.

A diplomacia sem amor, faz-te hipócrita.

O êxito sem amor, faz-te arrogante.

A riqueza sem amor, torna-te avaro.

A docilidade sem amor, torna-te servil.

A pobreza sem amor, faz-te orgulhoso.

A autoridade sem amor, torna-te tirano.

O trabalho sem amor, torna-te escravo.

A oração sem amor, torna-te introvertido.

A política sem amor, torna-te egoísta.

A fé sem amor, torna-te fanático.

A cruz sem amor converte-se em tortura.

A vida sem amor… não tem sentido.

HÉLDER GONÇALVES

quinta-feira, 26 de abril de 2012

ADORAR A DEUS

Jesus diz-nos o que é e como se adora.

Sabemos como toda a Sua vida está polarizada por fazer a vontade do Pai.

O Pai é o Seu absoluto.

Pai é a Sua primeira Palavra no templo e a Sua última Palavra na Cruz.

O Pai é a paixão da Sua vida e o Seu alimento é fazer a Sua vontade: “ninguém tem maior amor do que Aquele que dá a vida pelos seus amigos” (Jo 15,12).

Jesus na Sua experiência de deserto dá uma resposta ao tentador, firme e fiel: “Ao Senhor teu Deus adorarás, e só a Ele prestarás culto” (Mt 4,10s).

Quando na plenitude dos tempos, Deus se fez presente em Jesus, os que O seguem, sobretudo depois da ressurreição, descobrem que Ele é a grande teofania de Deus e adoram-n’O.

“Quando O viram, adoraram-n’O....” (Mt 28,17).

“Depois de se terem prostrado diante d’Ele, voltaram para Jerusalém…” (Lc 24,52).

N’Ele está a plenitude de Deus, é o Filho em quem o Pai deposita todas as suas complacências. “Por isso mesmo é que Deus o elevou acima de tudo e lhe concedeu o nome que está acima de todo o nome, para que, ao nome de Jesus, se dobrem todos de joelhos, os dos seres que estão no Céu, na terra e debaixo da terra; e toda a língua proclame: ‘Jesus Cristo é o Senhor! ‘Para a glória de Deus Pai” (Fil 2,9-11).

Paulo também proclama que a adoração reservada ao Deus único é devida também a “Jesus crucificado, confessado como Senhor e Cristo” (Act 2,36).

Adoramos a Cristo porque Ele é o grande Ícone de Deus, a plena manifestação da sua Glória. ‘Quem me vê a Mim, vê o Pai; quem Me ama, ama o Pai; quem Me adora, adora o Pai’.

Quantas pessoas, ao longo da história da salvação, têm ido buscar à adoração eucarística a força heroica para se darem sem medida aos outros?

Adorar a Deus é aceitar o maior e mais radical compromisso.

Deus, em Cristo Jesus, é adorável nas suas múltiplas presenças. Presenças onde muitas vezes se encontra escondido, calado, silencioso. Mas o homem e a mulher são santuário da glória de Deus; quem consegue penetrar com o olhar da fé na essência de todos os acontecimentos do dia-a-dia, percebe o ser e o actuar de Deus, e sente-se chamado como Moisés a adorar e a comprometer-se.

Adorar é dom do Espirito, e é o Espirito de Deus que transforma a nossa adoração e a pode levar à perfeição, porque “os que nasceram do espirito” (Jo 3,8) podem adorar “em espirito e verdade” (Jo 4,24).

O Beato Francisco Marto, o adorador e consolador de Jesus, é uma referência profunda para cada um de nós naquela extraordinária experiência mística da Loca do Cabeço. É no silêncio do sacrário e escondido entre as carrasqueiras, que este pastorinho descobre a forma específica de adorar. Tudo inventa, tudo imagina para consolar… fruto da sua pureza e da sua espontânea e surpreendente atitude interior de adoração: “Eu sabia que Deus estava em mim, mas não sabia como era”.

Desde o momento que o Beato Francisco entendeu quem era Deus, decidiu que só podia viver para Ele. Procura ter os mesmos sentimentos do próprio Deus, porque Deus está triste é porque ama e ele não descansa enquanto não alegrar a Deus.

Se nos reconhecermos eternamente amados por Deus, sabemos o que é amar a Deus, Criador e Senhor de todas as coisas.

HÉLDER GONÇALVES

quarta-feira, 25 de abril de 2012

EUCARISTIA

A Eucaristia actualiza a Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo, comprometendo-nos com ela e com o mundo novo, que ela inaugura e quer levar à consumação.

Somos um povo em marcha para a casa do Pai, um povo peregrino.

A Eucaristia é o alimento principal da viagem na caminhada para Deus.

A Eucaristia é a fonte e o cume de toda a acção eclesial. Todos os sacramentos são evangelizados, mas acima de tudo está na Eucaristia, ela surge como fonte e cume de toda a evangelização.

O mandato do Senhor è este: “Anunciareis a minha morte até que Eu venha”.

No mistério eucarístico, como memorial do mistério pascal, radicam-se as atitudes cristãs fundamentais que a mensagem evangélica nos apresenta: conversão, comunhão, caridade, reconciliação, fé pascal, amor fraterno e esperança eterna.

Na acção sacramental encontram-se todas as dimensões que a Igreja aprendeu de Cristo.

A Eucaristia é lugar de evangelização a três níveis: na caminhada que ela conduz, na preparação da celebração e na expressividade da própria celebração.

Somos chamados a viver em Eucaristia, viver para a Eucaristia e viver da Eucaristia. Ela é Pão para o mundo novo: mais justo, mais fraterno, mais pacífico, mais segundo o coração de Jesus e de Maria.

A Eucaristia é Pão para ajudar os homens a crescer na santidade de vida; para fazer nascer, naqueles que O recebem, um coração novo capaz de amar à semelhança do próprio Jesus.

A Eucaristia é Pão que nos alimenta, que nos h´-de transformar n’Aquele que recebemos; por isso, a Eucaristia é escola contínua de caridade, de dom, de serviço, de entrega.

Na Eucaristia proclamamos, vivemos e celebramos a nossa fé em Deus, revelado em Jesus Cristo e na sua palavra viva e eficaz.

A Eucaristia é o sinal e a fonte da Aliança dos crentes entre si, com Deus pai e com todos os homens.

A Eucaristia é, antes de tudo, uma exultação, uma resposta do homem frente à intervenção de Deus, que é um acontecimento histórico; um facto real que a história experimentou, que os homens experimentaram. É um dom de Deus, em Jesus Cristo, que nos é oferecido como nosso alimento espiritual.

A fé na Sagrada Escritura é uma garantia, uma experiência profunda, um acontecimento histórico experimental, é um acontecimento experimentável. Os Apóstolos viram Deus em Jesus Cristo, experimentaram-n’O e, então, confessaram-n’O com palavras e com obras. A fé é um encontro com o Absoluto, com Deus; é um acontecimento experimentável, é, em primeiro lugar, um dom de Deus, que espera uma resposta livre e consciente do homem. Os Apóstolos têm fé porque viveram e experimentaram Jesus Cristo ressuscitado dentro deles.

Na Eucaristia proclamamos o que Deus fez, é uma proclamação, confissão de fé (do que Deus fez), é uma resposta, uma confissão, uma proclamação e uma acção de graças pela Sua Palavra, que é acção tornada presente numa acção sagrada. Na Eucaristia proclamamos as coisas grandes que Deus fez em favor do Seu povo.

A manifestação progressiva de Deus ao Seu povo foi uma história de acontecimentos interligados: uma palavra que é a semente que cria raízes e frutifica, dando origem a uma árvore cuja manifestação máxima vamos ver em Jesus Cristo.

HÉLDER GONÇALVES

segunda-feira, 23 de abril de 2012

ECUMENISMO

Recentemente, há poucos dias, recebi uma mensagem no meu email de alguém que se diz ser católico, mas escreve coisas como estas que eu não podia deixar de dar uma resposta.

Poderia por a mensagem completa, mas escreve tantas barbaridades que eu prefiro não publicar.

Mas se diz que o meu blog é ecuménico, não vejo onde esteja o mal, pelo contrário, sinto-me lisonjeado, mas para além disso, a própria Igreja Católica tem vários documentos publicados sobre o ecumenismo e, assim sendo, quem for contra o ecumenismo é contra a Igreja Católica e até mesmo contra o próprio Papa.

Email: “O meu blog é católico, o vosso é ecumênico.
Esta porta (meu blog, meu email) é católica, de verdade, da Tradição e do Magistério, de véu na cabeça e joelho no chão, de terço na mão, uma mão que não toca a Santa Eucaristia para comungar, uma católica que não bate palmas com (e como) os protestantes, nem faz caras e bocas como os carismáticos; de uma Fé contida e sóbria, toda interior. Um Fé que é toda obediência na Verdade e chicote contra os vendilhões do Templo. Nada de ecumenismo aqui. Nada de confraternizar com os inimigos de Cristo. A outra face... é para as ofensa pessoais. Para quem ofende Deus: a espada. Nada de comunistas, de liberais, de feministas aqui! Apenas católicos são bem vindos. E antes que me venham com a lenga-lenga da caridade fraterna... aconselho-vos a reaprender os vossos conceitos, desde o início, do beabá, porque estão todos impregnados de um modernismo víscido e corruptor.”


PASSO A EXPLICAR:

- O que é um Concilio Ecuménico?

- Quantos houve até hoje?

- De que constou o Concilio Vaticano II ?

Um Concilio Ecuménico é uma reunião de todos os bispos, convocada e presidida pelo Papa, destinada a analisar e resolver questões de doutrina e disciplina de interesse para a Igreja Universal (Código Direito Canónico, 337, 341; etc…).

Considerando que a Igreja não estava ainda suficientemente expandida, o Concilio de Jerusalém só imprópriamente se poderia considerar ecuménico (convocação de todas as igrejas locais).


Por conseguinte, consideram-se, até agora, os seguintes Concílios Ecuménicos:

1. I de Niceia – 325
2. I de Constantinopla – 381
3. Éfeso – 431
4. Calcedónia – 451
5. II de Constantinopla – 553
6. III de Constantinopla – 680 – 681
7. II de Niceia – 787
8. IV de Constantinopla - 869 – 870
9. I de Latrão - 1123
10. II de Latrão - 1139
11. III de Latrão - 1179
12. IV de Latrão - 1215
13. I de Lyon - 1245
14. II de Lyon - 1274
15. Viena - 1311 – 1312
16. Constança - 1414 – 1418
17. Basileia – Ferrara – Florença - 1431 – 1443
18. V de Latrão - 1512 – 1517
19. Trento - 1545 – 1563 - com interrupções
20. Vaticano I - 1869 – 1870 - interrompido pela guerra da unificação da Itália.
21. Vaticano II - 1962 – 1965 - O Concilio de Vaticano II, anunciado a 25.01.1959 pelo Papa João XXIII e por ele convocado (Const. Ap. Humanae salutis, 25.12.1961), decorreu em quatro sessões, nos Outonos de 1962 a 1965, sendo as três últimas presididas pelo Papa Paulo VI. Destinado a promover a renovação da Igreja, produziu os seguintes documentos:

4 Constituições:

- Dogmática Lumen Gentium - sobre a Igreja.

- Dogmatica Dei Verbum - sobre a divina revelação.

- Sacrosanctum Concilium - sobre a sagrada liturgia.

- Pastoral Gaudium et Spes - sobre a Igreja no mundo actual.


9 Decretos:

- Christus Dominus - sobre o ministério pastoral dos bispos.

- Presbyterorum Ordinis - sobre o ministério e a vida dos sacerdotes.

- Optatam Totius - sobre a formação sacerdotal.

- Perfectae Caritatis - sobre a renovação da vida religiosa.

- Apostolicam Ecclesiarum - sobre as Igrejas orientais católicas.

- Ad Gentes - sobre a actividade missionária da Igreja.

- Unitatis Redintegratio - sobre o ecumenismo.

- Inter Mirifica - sobre os meios de comunicação social.


3 Declarações:

- Dignitatis Humanae - sobre a liberdade religiosa.

- Gravissimum Educationis - sobre a educação cristã da juventude.

- Nostra Aetate - sobre a relação da Igreja com as religiões não cristãs.


Depois disto tudo, acho que não tenho mais nada a acrescentar, a não ser que quem quiser consulte os documentos oficiais da Igreja antes de escrever asneiras e barbaridades, pois tem muito que ler.

Da minha parte, sou CATÒLICO sim, mas com muito orgulho da minha fé, sei bem o chão que piso e a fé que professo, mas não espezinho o meu irmão, independentemente da raça ou fé que professa, pois somos todos criaturas e filhos de Deus.

Em todas as religiões, existem pessoas boas e más, mas no mundo actual cada vez mais globalizado onde todos nos misturamos cada vez mais é importante conhecermo-nos uns aos outros, a fim de podermos conviver entre todos.

A única coisa que eu não aceito, são os extremistas e fundamentalistas como este, que nem ele próprio sabe o que é e o que professa. Está muito longe do ideal cristão.

Sejam TOLERANTES, para um mundo melhor.

HÉLDER GONÇALVES

sexta-feira, 20 de abril de 2012

PRIMEIRAS IGREJAS

Uma das primeiras Igrejas
* Organização das primeiras Igrejas

Embora a distribuição de funções num grupo seja a sua resposta às resistências que tem de vencer para alcançar os seus fins peculiares, ninguém deve esperar que o Novo Testamento ofereça já um modelo de organização eclesiástica perfeitamente acabado e completo, porque, além do mais, as necessidades mudam com os tempos e os lugares.

Os diversos serviços, funções e tarefas designam-se na igreja com o nome genérico de ministério (ministerium, serviço). Pode-se dizer que as primeiras comunidades sentiram-se livres para criar, pelo impulso do Espirito, os ministérios que em cada caso julgaram convenientes, conforme as necessidades que se iam apresentando. Por outro lado, é o Espirito quem estabelece a organização, porque é Ele quem move a comunidade em todos os aspectos. Adopta-se o que se crê adequado para servir aqui e agora a causa de Jesus e, deste modo, é o Senhor que edifica a Sua Igreja. Ele é, em cada momento, a razão da sua existência, o seu fundamento, a sua cabeça e o seu motor. Portanto, a igreja de todos os tempos não deve copiar sobretudo o organigrama inicial, mas o primeiro espirito que animou essa organização e que a teologia chamou apostolicidade. Será imprescindível distinguir aquilo que é imutável, por ser essencial à Igreja, das diversas formas históricas transitórias.

Conhecendo também até que ponto o meio físico e social condiciona as formas de agrupamento, è normal que não fosse uniforme a organização das Igrejas situadas em diferentes meios culturais.

Também é preciso observar que, não sendo a comunidade cristã um grupo dedicado ao culto, no sentido em que este termo è entendido nas ciências da religião, nem os serviços nem as pessoas que os exercem têm um caracter sagrado ou religioso especial. Aos olhos das pessoas que os comtemplam, os Apóstolos são tão leigos como o próprio Jesus. Na raíz deste facto está o conceito cristão de culto como cumprimento da vontade de Deus solidário com os homens e não como ritos cerimoniais praticados em lugares sagrados.

Nas primeiras comunidades dá-se uma importância primordial aos membros que possuem qualidades pessoais (carismas) que, postas ao serviço da comunidade, são interpretadas por esta como dons gratuitos de Deus à sua Igreja.

Apóstolos, profetas, doutores, evangelistas, etc…, que, não sendo actividades directamente dirigentes nem tendo poder de jurisdição, configuram uma Igreja de condição carismática.

Contudo, ainda agora dificilmente saberemos avaliar a importância daqueles que, num primeiro momento, abandonaram literalmente tudo (casa, família, propriedades e oficio), e praticaram o estilo de vida do Senhor como pregadores ambulantes. Este chamado radicalismo itinerante deu-se sobretudo nas zonas rurais palestinenses sendo os Apóstolos incluídos nele por alguns autores. Também houve organizadores itinerantes de comunidades que actuaram principalmente no mundo helenístico.

HÉLDER GONÇALVES

segunda-feira, 16 de abril de 2012

ORIGENS DA IGREJA

Algo teve de acontecer para que a causa de Jesus não terminasse no Calvário naquele Abril do ano +/- 30.

Os Seus seguidores, desiludidos e cheios de medo, dispersaram-se, mas pouco tempo depois voltaram a aparecer com uma actividade radicalmente diferente. A experiência pascal foi tão intensa que fez com que mudassem de tal maneira que não pareciam os mesmos. Um espirito, como diziam os seus contemporâneos, tinha-se apossado deles. Perante a sua nova postura, alguns comentavam: não são eles que assim procedem, mas o (espirito do) vinho que beberam; outros, no entanto, acreditavam no seu testemunho e confessavam que era o Espirito de Deus que falava pelas suas bocas. Aconteceu o Pentecostes.

A partir de então, os discípulos começaram a apregoar: «Saiba toda a casa de Israel, com absoluta certeza, que Deus estabeleceu como Senhor e Messias esse Jesus por vós crucificado» (Act 2,36).

A esta pregação Paulo chamará «Kerigma», palavra grega que designa a notícia que se apregoa para que toda a gente saiba. Também se lhe dará o nome de «Evangelho» ou Boa Nova.

À volta da pregação dos Apóstolos, foi-se formando e crescendo, pouco a pouco, uma comunidade à qual os Judeus chamaram «seita dos nazarenos» e que externamente não passava de mais um grupo, embora com características próprias dentro da pluralidade do Judaísmo daquele tempo.

A maioria dos primeiros cristãos era de Jerusalém ou, pelo menos, da Palestina. Falavam aramaico, a sua mentalidade era semita, liam a Bíblia em hebraico e, como é natural, sentiam-se muito arraigados às tradições judaicas, sobretudo relativas à sinagoga e ao Templo. Cumpriam estritamente a lei de Moisés incluindo a própria circuncisão. Aparentemente, o seu comportamento mal se distinguia do doutros judeus piedosos, tanto fariseus como essénios. A sua cultura era rural e a sua situação económica bastante baixa. Estes judeo-cristãos (assim se costuma chamar a esta facção da Igreja palestinense) eram muito bem vistos pelo povo e foram defendidos pelos fariseus, por mais de uma vez.

Mas havia também um número importante de fiéis que tinha vivido nas colónias de judeus das grandes cidades ribeirinhas do Mediterrâneo. Falavam grego comum ou Koiné, a sua mentalidade era muito ocidental, liam a Bíblia em grego e, além disso, estavam menos apegados à lei mosaica do que os palestinenses. O seu estilo era urbano e a sua situação económica desafogada. São conhecidos por cristãos helenistas.

No princípio, a união entre estes dois tipos de pessoas não apresentou nenhum género de problemas. Nas reuniões que celebravam nas suas casas escutavam o ensino dos Apóstolos, praticavam a comunidade de bens e celebravam a «fracção do pão», nome por que era conhecida a assembleia eucarística. Pedro ocupava um lugar de prioridade na comunidade, realçando-se também Tiago, «o irmão do Senhor». Ambos, juntamente com João, são chamados «colunas da Igreja».

Rapidamente, porém, surgiu um conflito. È bem provável que as coisas tenham acontecido assim: as sinagogas praticavam a beneficência para com os pobres através da «quppah» ou «caixa» na qual todos os judeus residentes depositavam uma quantia proporcional às suas receitas. Com estes recursos, os encarregados repartiam o necessário para que os pobres habituais daquela sinagoga pudessem comer duas vezes por dia. Quando os presidentes das sinagogas, talvez aborrecidos porque os cristãos helenistas não se portavam como bons judeus, decidiram excluir desta assistência os que confessavam que Jesus era o Messias, os cristãos tiveram de montar o seu próprio «serviço quotidiano» ou «serviço de mesa». Por causas que desconhecemos, os helenistas queixaram-se que os judeo-cristãos não atendiam bem as suas viúvas.

Para solucionar o problema, os doze (já então tinha sido eleito Matias para o lugar de Judas) dotaram os helenistas de uma organização própria: sete homens encarregar-se-iam do serviço da mesa e doutras funções similares às dos Apóstolos.

HÉLDER GONÇALVES

sábado, 14 de abril de 2012

DIVINA MISERICÓRDIA

II Domingo de Páscoa

«Ó Senhor! Que eu não seja incrédulo mas crente» (Jo, 20, 27)»


1. No evangelho de S. João (20, 19-29), o relato da aparição de Jesus aos apóstolos reunidos no cenáculo aprenta-se enriquecida com pormenores de grande interesse. Na tarde da Ressureição, depois de ter confiado aos seus a missão recebida do Pai - «assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós» - comunicou-lhes o Espirito Santo. «Soprou sobre eles e disse-lhes: recebei o Espirito Santo; os pecados ficarão perdoados àqueles a quem os perdoardes; e ficarão retidos àqueles que os retiverdes». Não se trata do dom do Espirito Santo em forma visível e pública, como acontecera no dia de Pentecostes; no entanto, é muito significativo que, no próprio dia da Ressureição, Jesus tenha derramado sobre os apóstolos o Seu Espirito. Desta maneira, o Espirito Santo aparece como o primeiro dom de Cristo ressuscitado à sua igreja no momento em que esta é por Ele instituída e enviada a perpetuar a sua missão no mundo. E com a efusão do Espirito Santo, a instituição da penitência que, juntamente com o Baptismo e a Eucaristia, é um sacramento eminentemente pascal, sinal eficaz da remissão dos pecados e da reconciliação dos homens com Deus realizadas pelo sacrifício de Cristo.

Mas, naquela tarde, Tomé estava ausente, quando regressa não quer acreditar que Jesus tenha ressuscitado: «senão lhe vir nas mãos a marca dos cravos, se não meter o dedo no sítio dos cravos e a mão no Seu lado, não acreditarei». Não se contenta com ver, mas tem que meter a mão nas profundidades das chagas. Jesus toma-lhe a palavra. «oito dias depois» volta e diz-lhe: «chega aqui o teu dedo e vê as minhas mãos, aproxima a tua mão e mete-a no Meu lado: e não sejas incrédulo, mas crente». O Senhor tem compaixão da teimosa incredulidade do apóstolo e, com infinita bondade, oferece-lhe as provas exigidas por ele com tão grande arrogância. Tomé dá-se por vencido e a sua incredulidade desaparece num grande acto de fé: «meu Senhor e meu Deus!» este precioso ensinamento é uma admoestação para todos os crentes para que não desanimem nas suas dúvidas e dificuldades que possam ter para acreditar. Antes, é necessário sentir compaixão pelos que vacilam e não acreditam e ajudá-los com a oração, lembrando que «o amor de Cristo incita-nos a agir com amor, prudência e paciência para com os homens que se encontram no erro ou na ignorância relativamente a fé»


2. «Porque me viste, acreditaste, felizes os que acreditam sem ter visto» (Jo 20,29). Deste modo, Jesus louva a fé de todos que haveriam de acreditar n´Ele sem o apoio de experiências sensíveis. O elogio de Jesus ecoa na voz de Pedro, comovido pela fé viva dos primeiros cristãos que acreditavam em Jesus como se O tivessem conhecido pessoalmente: «vós amais Jesus Cristo sem o terdes conhecido. Ele, como n´Ele acreditais sem o verdes ainda estais cheios de alegria indiscritível e gloriosa» (I Ped 1,8). Eis aqui a bem-aventurança dos crentes de todos os tempos. Diante das dificuldades e da fadiga para crer é preciso recordar as palavras de Jesus para encontrar nelas o amparo de uma fé despojada e nua, mas com a garantia de estar fundamentada na Palavra de Deus.

A fé em Cristo era a força que congregava os primitivos cristãos numa coesão perfeita de sentimentos e de via: «a multidão dos que abraçavam a fé tinha um só coração e uma só alma» (Act 4,32). Era esta a característica fundamental da primeira comunidade cristã nascida do «poder» com que «os apóstolos davam testemunho da Ressureição do Senhor», e do correspondente poder da fé de cada um dos crentes: a fé tao arreigada que os levava a renunciarem, voluntariamente, aos próprios bens para os colocar à disposição dos mais necessitados, considerados verdadeiramente irmãos em Cristo, não era uma fé de teorias, ideologias, mas sim tão concreta e operante, que causava uma admiração completamente nova na vida dos crentes , não apenas no âmbito das relações para com Deus e da oração, mas também no das relações para com o próximo e até no âmbito dos interesses materiais em que o homem é extremamente zeloso. É esta a fé que, hoje, tanto escasseia: para muitos que dizem ser crentes, a fé não exerce influência alguma nos seus costumes nem na sua vida. Um cristianismo assim não convence, nem converte o mundo. É preciso voltar a acomodar a própria fé profunda, pois que no poder da fé, esta a certeza da vitória dos cristãos. «é esta a vitoria que vence o mundo: a nossa fé! Quem é que vence o mundo senão aquele que crê que Jesus é Filho de Deus!» (I Jo, 5, 4-5)


Meu Deus, adoro-te como o apóstolo Tomé. Se pequei por incredulidade como ele, adoro-te agora mais profundamente «meu Senhor e meu Deus», meu Deus e meu tudo. A Ti e só a Ti devo desejar!

Tomé aproximou-se para tocar nas tuas Santíssimas Chagas. Chegara o dia em que eu possa, de modo real e visível, inclinar-me para as beijar? Que diz feliz será esse em que, completamente livre de qualquer rasto de impureza e de pecado, possa aproximar-me do Deus feito homem no Seu trono de glória! Que maravilhoso amanhecer aquele em que, expiadas as minhas culpas, poderei ver, pela primeira vez, com estes meus olhos, o Teu rosto Divino, fixá-los no Teu olhar e aproximar-me, sem temor para beijar, cheio de alegria, os Teus pés e ser recebido nos teus braços. Ó único e verdadeiro amigo da minha alma, quero, desde já, amar-Te para poder amar-Te nesse dia!

Será um dia eterno, sem fim e tão diferente dos dias desta vida. Agora sinto sobre mim o peso «corpo mortal»; mil pensamentos me assaltam e me distraem e cada um deles seria suficiente para me afastar do Céu. Mas, naquele dia, já não haverá possibilidade alguma do pecado… prefeito e agradável aos teus olhos, poderei mantes a tua presença sem temor e, rodeado dos anjos e arcanjos, já não terei vergonha de ver que me observam.

Embora não esteja ainda preparado para Te ver e tocar, ó meu Deus, quero aproximar-me de Ti e alcançar, com o desejo, aquilo que, por agora, não posso conseguir.

Ó Senhor Jesus Cristo! Não te contemplamos na carne com os olhos do corpo e no entanto sabemos, acreditamos e professamos que Tu és Deus verdadeiro. Ó Senhor! Que esta nossa profissão de fé nos leve para a glória, que esta fé nos salve na segunda morte, que esta esperança nos conforte quando chorarmos no meio de tantas tribulações e nos conduza às alegrias eternas. E, após a provação desta vida, quando chegarmos à meta da vocação celeste e contemplando o Teu Corpo glorificado em Deus… também os nossos corpos hão-de participar da Tua glória, ó Cristo, nossa cabeça.

RICARDO IGREJA

sexta-feira, 13 de abril de 2012

DIVINA MISERICÓRDIA

Vamos celebrar o dia da Divina Misericórdia.

Segundo o Evangelho de São João o nascimento da Igreja deu-se no próprio Domingo de Páscoa em que estavam reunidos, de portas fechadas, por medo dos judeus, quando Jesus entrou, saudou e derramou sobre eles o Espírito Santo.

Para João o Pentecostes foi no mesmo dia da ressurreição, é importante essa colocação, diferentemente de Lucas que coloca o Pentecostes 50 dias após a Páscoa e com o derramamento dos dons, João apresenta como fruto do derramamento do Espírito, o maior Dom da Igreja - “Recebei o Espírito Santo. A quem perdoardes os pecados, eles lhes serão perdoados; a quem os não perdoardes, eles serão-lhes retidos”.

Esse é o maior Dom da nossa Igreja – manifestar a Misericórdia de Deus no meio do Seu povo – E proporcionar à pessoa caída pelo pecado à reconciliação com o seu Senhor. Foi à Igreja que Deus deu o poder, no Espírito Santo, de conduzir o seu povo à salvação. Por isso celebramos o dia da “Divina Misericórdia”.

Pela Igreja recebemos o Espírito Santo, pela Igreja somos perdoados dos nossos pecados, “Meus filhinhos, isto vos escrevo para que não pequeis. Mas, se alguém pecar, temos um intercessor junto do Pai, Jesus Cristo, o Justo”. (1 Jo 2, 1).

Pela Igreja somos feitos filhos de Deus em Jesus Cristo, pela Igreja somos salvos, pois é Ela que manifesta as bênçãos de Deus sobre nós. É isso que vemos na primeira leitura, a comunidade: “Eram perseverantes em ouvir o ensinamento dos Apóstolos, na comunhão fraterna, na fracção do pão e nas orações”.

Estes quatros pontos em negrito é que fazem a Igreja ser a Igreja de Cristo. Tudo foi confiado à Igreja – “E eu te declaro: tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra ela, Eu te darei as chaves do Reino dos Céus: tudo o que ligares na terra será ligado nos Céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus”. (MT 16, 18-19).

Pois bem, estamos diante de um grande mistério – A IGREJA – Esta é por excelência o lugar privilegiado da manifestação de Deus e tu és chamado a fazer parte, ser membro activo desta manifestação, sente-te feliz por seres Católico.

Vemos também a figura de Tomé, ele não estava junto com a comunidade reunida na primeira aparição de Jesus e, portanto não passou pela experiência com o ressuscitado, assim quando foi informado do que havia acontecido naquele encontro memorável, não acreditou, mas não porque não tinha fé e sim porque não teve a experiência com o ressuscitado.

Isso também acontece no nosso meio, quando uma pessoa vai fazer um retiro volta todo empolgado, com um fogo novo fruto de um encontro com Cristo e ao chegar a casa, no trabalho, na escola...

Quer contar a todos e quer mudar o mundo, mas aquelas pessoas não entendem e até falam mal, recriminam, porque não passaram pela experiência que o retirante passou.

Vejam o caso de Maria depois da anunciação. Quem poderia entender o que se passou com Ela? Somente Isabel que passou, também por uma experiência de Deus, de forma diferente é claro.

Assim Tomé ficou intrigado, mas oito dias depois, isto é neste domingo, a comunidade estava reunida novamente, e agora Tomé estava junto, e com toda certeza estava na expectativa de que algo iria acontecer com ele, também. E aconteceu. Tomé teve a sua experiência com o ressuscitado de tal forma que até tocou no Senhor, è muito importante – A experiência dele foi tão forte que percebeu de forma intima quem era Jesus e exclamou o que ninguém havia percebido de forma tão particular – “Meu Senhor e Meu Deus”.

A Experiência com o ressuscitado leva-nos a descobrir: “É como está escrito: Coisas que os olhos não viram, nem os ouvidos ouviram, nem o coração humano imaginou (Is 64,4), tais são os bens que Deus tem preparado para aqueles que o amam” (1 Cor 2, 9).

Vemos que Tomé foi a fundo com o ressuscitado e quem sabe agora é a sua vez?

Tu já descobriste, já saboreaste o que Jesus tem reservado só para ti numa experiência intima, Ele está à espera, vê: “Eis que estou à porta e bato: se alguém ouvir a minha voz e me abrir à porta, entrarei em sua casa e cearemos, Eu com ele e ele Comigo”. (Ap 3,20).

Jesus quer fazer uma festa íntima contigo, não percas tempo, Ele traz-nos a Misericórdia do Pai que perdoa todos os nossos pecados e leva-nos a uma íntima união com Ele.

Então não existe empecilho é só “ouvir a minha voz e me abrir à porta”.

Psiu! Silêncio! Ouça, Ele está a chamar-te a uma comunhão de amor. Rende-te. E tocará no infinito do Amor e a eternidade tocará no teu coração e, certamente tu nunca mais serás a mesma pessoa.

Foi o que aconteceu com Tomé, com os Apóstolos, com Paulo, com os milhares e milhares de pessoas nestes dois mil anos de caminhada em que Jesus vem tocando nos corações, formando um grande exército de irmãos para a Glória do Pai.

E tu fazes parte deste exército.

HÉLDER GONÇALVES

quarta-feira, 11 de abril de 2012

MENSAGEM CRISTÃ

Em que consiste a mensagem cristã ?

Consiste no anúncio de Jesus Cristo.


Ele é a Boa Nova (Evangelho) que os apóstolos proclamavam desde o princípio, como escreve São Paulo: «Lembro-vos, irmãos, o evangelho que vos anunciei, que vós recebestes, no qual permaneceis firmes e pelo qual sereis salvos… Transmiti-vos, em primeiro lugar, o que eu próprio recebi: Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras; foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras; apareceu a Cefas e depois aos Doze» (1 Cor 15,1-5).

Essa mensagem refere-se directamente à morte e ressurreição de Jesus pela nossa salvação, e acrescenta que Jesus é o Messias (Cristo), enviado por Deus, tal como havia sido prometido a Israel. O anuncio de Jesus Cristo abarca, portanto, a fé no Deus único, Criador do mundo e do homem, e principal protagonista da história da salvação.

A mensagem cristã anuncia que com Jesus Cristo se realizou plenamente a revelação de Deus ao homem: «Quando chegou a plenitude do tempo, Deus enviou o Seu Filho, nascido de uma mulher, nascido sob domínio da Lei, para resgatar os que se encontravam sob o domínio da Lei, a fim de recebermos a adopção de filhos» (Gal 4,4-5).

Jesus revela quem é Deus de uma maneira nova e mais profunda do que a conhecida do povo de Israel; revela Deus como seu Pai de forma única, chegando até a dizer: «Eu e o Pai somos um» (Jo 10,30). Apoiando-se nos ensinamentos dos apóstolos, a Igreja anuncia Jesus Cristo como Filho de Deus e verdadeiro Deus, da mesma natureza que o Pai.

Durante a sua vida na terra, Jesus agiu com o poder de Deus e do Espirito Santo divino que estava nele (Lc 4,18-21), e além disso prometeu enviar o Espirito depois da sua ressurreição e glorificação junto do Pai (Jo 14,16). Quando os apóstolos receberam o Espirito Santo, no dia do Pentecostes, compreenderam que Jesus tinha cumprido a sua promessa a partir do Céu, e experimentaram a sua força transformadora. O Espirito Santo continua a vivificar a Igreja como sua alma. A mensagem cristã inclui, portanto, o Espirito Santo, verdadeiro Deus e terceira Pessoa da Santíssima Trindade.

A mensagem cristã anúncia, também, aquilo que anunciava Jesus Cristo: o Reino de Deus (Mc 1,15). Jesus encheu de sentido essa expressão simbólica, revelando com ela a presença de Deus na história humana e, no final da mesma, a união de Deus com o homem.

Jesus anunciava o Reino de Deus como já tendo começado, mediante a Sua presença no meio dos homens e as suas acções libertadoras do poder do demónio e do mal (Mt 12,28). É essa presença e acção de Jesus Cristo que permanece na Igreja por obra do Espirito Santo. A Igreja é, na história humana, com que o gérmen e a semente desse Reino, que culminará gloriosamente com a segunda vinda de jesus Cristo, no fim dos tempos. Entretanto, nela o homem adquire, mediante o Baptismo, uma nova relação com Deus, a de Filho de Deus, unido a Jesus Cristo, que culminará, depois da morte, na ressurreição final. Cristo continua a estar realmente presente na Igreja através da Eucaristia, actuando de igual modo através dos restantes Sacramentos, sinais eficazes da sua graça. Mediante a acção dos cristãos, se estes vivem em caridade, vai-se manifestando o amor de Deus a todos os homens. Tudo isto faz parte da mensagem cristã.

HÉLDER GONÇALVES

domingo, 8 de abril de 2012

CRISTO RESSUSCITOU

Domingo de Páscoa


 «Dai graças ao Senhor porque ele é bom!
Porque é eterna a sua misericórdia»


1. «Eis o dia que fez o Senhor; nele exultemos e nos alegremos» (Salmo responsorial). É o dia mais alegre do ano, porque «o príncipe da vida reina vivo apos a morte» (sequencia). Se Jesus não tivesse ressuscitado, teria sido em vão a sua encarnação e a sua morte não teria sido princípio de vida para os homens. «Se cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé» (I Cor 15, 17), exclama S. Paulo. Porque quem poderá acreditar e ter esperança num morto? Mas cristo não é um morto, esta vivo. «Procurais jesus de nazaré, o crucificado? – perguntou o anjo às mulheres – ressuscitou, não esta aqui» (Mc 16, 6).

A boa nova da ressurreição provocou, num primeiro momento, um temor e espanto tais, que as mulheres saíram e fugiram do túmulo … e não disseram nada a ninguém porque tinham medo» Entre elas porem, encontrava-se Maria Madalena que «viu a pedra retirada do túmulo» e correu a dar a notícia a pedro e João: «tiraram do túmulo do senhor e não sabemos onde o puseram» (Jo 20, 12). O dois saem correndo para o sepulcro e, entrando no túmulo «observaram as ligaduras, que estavam no chão e o lençol. Enrolado para outro sítio» veem e acreditam. É o primeiro ato de fé da igreja nascente em cristo ressuscitado, originado pela solicitude de uma mulher e pelos sinais das ligaduras encontradas no sepulcro vazio. Se tratasse dum roubo, quem se teria preocupado em despir o cadáver e colocar o lençol com tanto cuidado? Deus serve-se de coisas bem simples para iluminar os discípulos que «ainda não tinham entendido a escritura, segundo a qual jesus devia ressuscitar dos mortos» (Ibid. 9), nem compreendiam ainda o que o próprio Jesus tinha predito acerca da sua ressurreição. Pedro, cabeça visível da igreja, e João «e outro discípulo que jesus amava» tiveram a honra de recolher os sinais de jesus ressuscitado: a notícia levada por uma mulher, o sepulcro vazio, o lenço nele depositado.

Ainda que sob outro aspecto, os sinais da ressurreição veem-se ainda presentes no mundo: a fé heroica, a vida evangélica de tanta gente humilde e escondida; a vitalidade da igreja que as perseguições externas e as lutas internas não chegam a enfraquecer; a eucaristia, presença viva de jesus ressuscitado que continua a atrair a si todos os homens. Pertence a cada um dos homens vislumbrar e aceitar estes sinais, acreditar como acreditaram os apóstolos e tornar cada vez mais firme a sua fé.


2. A liturgia pascal lembra, na primeira leitura, um dos mais comoventes discursos de pedro sobre a ressurreição de jesus: «Deus ressuscitou-o ao terceiro dia e concedeu-lhe que se tornasse visível… às testemunhas de antemão designadas por deus, a nos que comemos e bebemos com ele, depois de ter ressuscitado dos mortos» (Act 10, 40-41). Surge nestas palavras a vibrante emoção do chefe dos apóstolos pelos grandes acontecimentos de que foi testemunha, pela intimidade com cristo ressuscitado, sentando-se a mesma mesa e comendo com Ele.

A páscoa convida todos os fieis a uma mesa comum com cristo ressuscitado e na qual Ele próprio é comida e bebida: «cristo, nossa páscoa, foi imolado; celebremos a mesa do senhor (vers. Do aleluia). Este versículo esta tomado da primeira carta aos coríntios em que s. Paulo, referindo-se ao ritual que ordenava comer o cordeiro pascal com pão ázimo – sem fermento – exorta os cristãos a prescindir do «fermento velho… da malicia e perversidade», a fim de celebrar a pascoa «com pães ázimos da pureza e da verdade» (I Cor 5, 7-8). Temos que aproximar-nos da mesa de cristo, o verdadeiro cordeiro imolado pela salvação dos homens, com pureza de coração e em verdade; por outras palavras, com coração próprio de ressuscitados. A ressurreição do senhor, a sua «passagem» da morte para a vida, deve refletir-se na ressurreição dos crentes, atualizada com uma «passagem» cada vez mais radical das fraquezas do homem velho para vida nova em cristo. Esta ressurreição é evidente no desejo sincero pelas coisas do céu. «Uma vez que ressuscitastes com cristo, diz o apóstolo, aspirai as coisas do alto, onde cristo se encontra sentado a direita de Deus»; afeiçoai-vos as coisas do alto e não as coisas da terra» (Cor 3, 1-2). A necessidade de se preocupar com as coisas terrenas não deve impedir aos «ressuscitados com cristo» que tenham o coração orientado para as realidade eternas, as únicas que são definitivas. Espreita-nos sempre a tentaçao de nos instalarmos neste mundo como se fosse a nossa pátria definitiva.

A ressurreição do senhor é um apelo muito forte: lembra-nos sempre que vivemos neste mundo em acomodação provisoria e que estamos em viagem para a verdadeira pátria, a eterna. Cristo ressuscitou para levar consigo os homens, na sua ressurreição, para onde ele vive eternamente fazendo-os participantes da sua glória.

Esta é a pascoa, a páscoa do senhor… é a páscoa, não figurada, mas real; não é já a sombra, mas a páscoa do Senhor em toda a sua verdade.

Na verdade, jesus, tu nos defendeste de um desastre sem nome, estendeste os teus braços paternais, abrigaste-nos sob as tuas asas, derramaste o sangue de um deus sobre a terra para selar a sangrenta aliança em favor dos homens que amas. Afastaste as ameaças da cólera e devolveste-nos a reconciliação de deus… Ó tu, único entre os únicos, tudo em todos que os céus possuam o teu espirito e a tua alma, mas que o Teu Sangue continue a pertencer à terra!

Ó páscoa de Deus que desce à terra e volta a subir ao céu! O alegria universal, honra, festim, delicias, trevas da morte dissipadas; restitui a vida a todos e abram-se as portas do céu! Deus fez-se homem e o homem fez-se deus…

Ó páscoa de Deus! O Deus do céu! Na sua liberdade, uniu-se a nos no espirito, e imensa sala das bodas encheu-se de convidados; todos tem a veste nupcial e nenhum é deitado fora por não ter a veste… as lâmpadas das virgens não voltarão a apagar-se. Em todos arde o fogo da graça de maneira divina, no corpo e no espirito, pois oque as faz arder é o azeite de cristo…

Pedimos-te, deus soberano, Cristo, rei no espirito e na eternidade que estendas as tuas mãos sobre a igreja santa e sobre o teu povo santo que continua a ser teu; defende-o, guarda-o, conserva-o, luta por ele, submete todos os inimigos ao teu poder… concede-nos poder cantar com Moisés o cântico triunfal. Pois tua é a glória e o poder dos seculos pelos seculos dos seculos.

Ó Cristo ressuscitado! Também nos temos que ressuscitar contigo; Tu escondeste-te à vista dos homens e nos temos que seguir-te; regressaste para o pai e temos que procurar que a nossa vida «esteja escondida contigo em Deus» … é obrigação e privilégio de todos os discípulos, senhor, ser elevados e transfigurados contigo; é privilégio nosso viver no céu com os nossos pensamentos, aspirações, desejos e afetos, ainda que permanecendo na carne… ensina-nos a «aspirar às coisas do alto» (Col 3,1), demonstrando assim que te pertencemos, que o nosso coração ressuscitou contigo e em ti esta escondida a nossa vida.

RICARDO IGREJA

sábado, 7 de abril de 2012

SÁBADO SANTO - Vigília Pascal

À espera da Ressurreição


«A minha força e o meu poder é o Senhor;
Ele foi a minha salvação»


1. O sábado santo é o dia mais indicado para contemplar o mistério pascal da paixão-morte-ressurreição do senhor para o qual converge e actua a história da salvação. É o convite da liturgia propondo uma seria de leituras bíblicas que incluem as etapas mais importantes deste história maravilhosa para, depois, incidirem no mistério de cristo. Antes de mais, aparece a obra da criação (1ª leitura) saída das mãos de Deus e contemplada por ele com agrado: «Deus viu tudo o que tinha feito; era tudo muito bom» (Gen 1, 31). De Deus, bondade infinita, só podem sair coisas boas e, se o pecado vem alterar bem depressa toda a criação, Deus, na sua bondade, projeta imediatamente a restauração que realizara por intermedio do seu filho. D´Este aparece, a seguir, uma figura profética, Isaac, que Abraão se dispõe a imolar par obedecer ao mandato divino (2ª leitura). Se Isaac foi libertado, Cristo, depois de ter sofrido a morte, ressuscitara glorioso.

Um outro acontecimento notável é a passagem milagrosa do Mar Vermelho (3ª leitura) feita, por intervenção de Deus, pelo povo de Israel, e que é símbolo do Batismo pelo qual, os que acreditam em Cristo «passam» da escravidão do pecado e da morte para a liberdade e para a vida de filhos de Deus. Seguem-se belíssimos textos proféticos acerca da misericórdia redentora do senhor que, apesar das contínuas infidelidades dos homens, não cessa de desejar a sua salvação. Depois de ter castigado as culpas do seu povo, deus chama-se a si como o carinho dum esposo fiel para com a esposa que o traiu: «por um breve momento, abandonei-te mas vou recolher-te com imensa misericórdia…; com amor eterno tenho compaixão de ti – diz o senhor, teu redentor» (Is 54, 7-8). Por isso o convite instante a não deixar passar em vão a hora da misericórdia: «buscai o senhor, enquanto se pode encontrar, invocai-o enquanto esta perto. Deixe o impio os seus caminhos e o pecador os seus projetos: volte-se para o senhor que terá piedade dele, para o nosso deus que é generoso em perdoar» (Is 55, 6-7). Se tudo isto foi verdade, em relação ao povo de Israel, com muito maior razão o é para o povo cristão, para quem a misericórdia de Deus alcançou o seu vértice no mistério pascal de cristo. E cristo, «nossa pascoa», cordeiro imolado de pela salvação do mundo, anima todos os homens a abandonarem o caminho do pecado e a regressarem à casa do pai, caminhando na «claridade do seu esplendor», na alegria de conhecer e fazer aquilo que agrada ao senhor» (Bar 4, 2.4).


2. A história da salvação culmina no mistério pascal de cristo, faz-se a história de cada homem pelo batismo que o enxerta neste mistério. De facto, por este sacramento, «sepultamo-nos com ele na morte, e assim como cristo ressuscitou dos mortos…, também nos caminharemos numa vida nova» (Rom 6, 4). Isto explica o porque do batismo ocupar um lugar tao sublime na liturgia da vigília pascal; nos textos bíblicos e nas orações, particularmente no ritual da bênção da água e na administração do sacramento aos neófitos e, por fim, na renovação das promessas do batismo. Celebrar a páscoa significa «passar» com cristo da morte para a vida, «passagem iniciada no batismo, mas que deve concretizar-se sempre mais plenamente durante a vida inteira do cristão. «Se nos tornamos um só com cristo por mote semelhante a sua – urge S. Paulo -, um só com ele ficaremos também por ressurreição semelhante à d´ele”.´

Não se trata de velas expressões, mas de realidades sublimes, de transformações radicais operadas pelo batismo e das quais tao facilmente, tao inconscientemente se esquecem os cristãos. Participar na morte de cristo quer dizer morrer com ele «para o pecado de uma vez para sempre» e por conseguinte, morrer a cada momento as mas inclinações, ao egoísmo, ao orgulho; quer dizer – em conformidade com as três renúncias das promessas batismais – renunciar cada vez mais conscientemente a satanás, as suas obras, as suas seduções. E, tudo isto, não apenas de palavra e só no tempo que dura a cerimonia litúrgica, mas durante toda a vida. «Considerai-vos mortos para o pecado – grita o apóstolo – e vivos para deus, em cristo jesus»

Pelo batismo, não só recebido mas vivido, o povo cristão apresenta-se como aquele povo preconizado pelo profeta Ezequiel (36, 25-26; 1ª leitura), limpo e purificado com «águas puras» que manam do lado trespassado de cristo, que recebe de deus «um coração renovado» e «um espirito novo», dons eminentemente pascais. Com estas disposições, cada um dos fiéis pode considerar-se preparado para cantar o aleluia, a associar-se à alegria da igreja perante o anúncio da ressurreição do senhor, considerando-se também ele, ressuscitado com cristo para glória de deus pai.

Ó pai omnipotente! tu és o deus eterno e incompreensível que, ao ver o género humano morto pela miséria da sua fragilidade, movido apenas pelo amor e piedade clementíssima, nos enviastes o verdadeiro Deus e Senhor nosso, Jesus Cristo, Teu filho, revestido dos andrajos da nossa carne mortal. E quisestes que viesse, não com as pompas deste mundo transitório, mas com a angústia, a pobreza e os tormentos, conhecendo e cumprindo a tua vontade em favor da nossa redenção…

E tu, cristo jesus, nosso redentor, sofreste no teu corpo o castigo das nossas iniquidades e da desobediência Adão, fazendo-te obediente ate ao opróbrio da morte de cruz. Na cruz jesus, amor dulcíssimo… satisfizeste por nos e, ao mesmo tempo, reparaste em ti mesmo as injurias feitas ao pai.

Peccavi, Domine, miserere mei. Para onde quer que eu me volte, encontro amor inefável; e não posso excursar-me de amar, já que só tu, deus e homem, és aquele que me amaste sem eu te ter amado; efetivamente eu não existia e tu criaste-me. Tudo o que quero amar, encontro-o em ti… se quiser amar a deus, encontro em tia a inefável divindade; se quiser amar o homem, tu és o homem…; se quiser amar o senhor, tu pagaste com o preço do teu sangue a minha libertação do pecado. Tu és senhor, pai e irmão nosso pela tua benignidade e excessiva caridade.

Ó Deus: pelo mistério pascal, com cristo fomos sepultados no batismo para vivermos com ele uma vida nova. Por isso, terminada a exercitação quaresmal, renovamos as promessas do santo batismo, pelas quais renunciamos outrora a satanás e as suas obras e prometemos servir a deus na santa igreja católica.

Deus todo-poderoso, pai de nosso senhor jesus cristo, que nos regenerou pela água e pelo espirito santo, e que nos perdoa todos os pecados, nos guarde com a sua graça em Jesus Cristo Nosso Senhor, para a vida eterna.

RICARDO IGREJA

quinta-feira, 5 de abril de 2012

SEXTA-FEIRA SANTA

Trespassado pelas nossas culpas


«Pai, nas vossas mãos entrego o Meu espirito!
Senhor, Deus fiel, salvai-me!»


1. A liturgia da sexta-feira santa é uma comovedora contemplação do mistério da cruz e tem por finalidade, não apenas comemorar, mas sim fazer reviver aos cristãos a paixão dolorosa do Senhor. São dois os grandes textos que a apresentam: o texto profético atribuído a Isaías (Is 52,13; 53, 1-12) e o texto histórico de S. João (18, 1-19, 42). A grande distância de mais de sete seculos que os separa fica anulada pela impressionante coincidência dos factos, referidos pelo profeta na descrição dos padecimentos do servo de Javé e, pelo evangelista, como narração da última etapa da vida de jesus na terra. «Muitos se encheram de espanto a vista dele – diz Isaías – pois tinha perdido o aspeto de homem… desprezado e repelido pelos homens, homem de dores afeito ao sofrimento» (Is 52, 14; 53, 3).

E S. João, tal como os outros evangelistas, fala de jesus atraiçoado, insultado, esbofeteado, coroado de espinhos, escarnecido e apresentado ao povo como rei caricato, condenado, crucificado. O profeta particulariza a causa de tanto sofrimento: «Foi trespassado por causa das nossas culpas e esmagado devido as nossas faltas» e indica também o seu valor expiatório: «o castigo que nos salva caiu sobre ele e por causa das suas chagas é que fomos curados» (Is 53,5). Nem sequer falta a alusão ao sentido de repulsa da parte de deus: «nos víamos nele um homem castigado, ferido por deus e sujeito à humilhação» (ibid. 4) e que jesus desabafou na cruz com este grito: «Meu Deus, Meu Deus, porque me abandonaste?» (Mt 27,46).

Mas, sobretudo, aparece bem evidente a voluntariedade do sacrifício da expiação» (Is 53, 10); voluntariamente Cristo entrega-se aos soldados depois de os ter feito retroceder e cair por terra com uma só palavra (Jo18, 6) e livremente, deixa-se levar a morte, ele que tinha dito: «ninguém me tira a vida; sou eu que a dou por mim mesmo» (Jo 10, 18). O profeta chegou mesmo a vislumbrar a conclusão gloriosa deste sofrimento voluntario: «terminadas as suas provações, vera a luz e ficara saciado… por isso, diz o senhor, dar-lhe-ei multidões como premio… é que ele entregou-se a morte a si próprio» (Is 53, 11.12). E jesus, aludindo a sua paixão, disse: «eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a mim» (Jo 12, 32). Tudo isto prova que a Cruz de Cristo se encontra mesmo no centro da salvação, já prevista no antigo testamento através dos sofrimentos do servo de Javé, figura do messias que viria salvar a humanidade, não com triunfo ternos, mas com o sacrifico de si mesmo. É este precisamente o caminho que todos os fiéis devem percorrer para serem salvos e salvadores.


2. Entre a leitura de Isaías e a de S. João, a liturgia intercala um trecho da Carta aos Hebreus (4, 14-16; 5,7-9). Jesus, Filho de Deus, é apresentado na sua qualidade de sumo e único sacerdote, mas não tao longínquo dos homens, «incapaz de se compadecer das nossas fraquezas, mas com a experiencia de todas as provações, tal como nós, com exceção do pecado». É a prova da sua vida terrena, principalmente na sua paixão pela qual experimentou, na sua própria carne inocente todas as amarguras, os sofrimentos, as angustias, as fraquezas da natureza humana. Assim e ao mesmo tempo, ele é sacerdote e vitima e não oferece, para expiação dos pecados dos homens, sangue de touros ou de cordeiros, mas o seu próprio sangue.

«Nos dias da sua vida mortal, cristo dirigiu preces e suplicas com forte brado e com lagrimas àquele que o podia livrar da morte». É o eco da agonia no Getsémani: «Abba, Pai; tudo te é possível; afasta de mim este cálice. Contudo não se faça o que eu quero, mas o que tu queres». (Mc 14, 36). Obedecendo á vontade do pai, entrega-se à morte a, após ter saboreado todas as suas amarguras, vê-se livre delas pela ressurreição «tornando-se, para todos aqueles que lhe obedecem, causa de salvação eterna» (Heb 5,9). Obedecer a Cristo, sacerdote e vitima, significa aceitar como ele aceitou, a cruz, em total abandono à vontade do pai: «pai, nas vossas mãos entrego o meu espirito» (Lc 23, 46; cfr. Salmo responsorial).

Mas a morte de cristo seguiu-se imediatamente a sua glorificação. O centurião exclama: «realmente este homem era justo. E toda a multidão que tinha acorrido aquele espetáculo, regressava batendo no peito» (Lc23, 47-48). A igreja segue o mesmo itinerário e, apos ter chorado a morte do salvador, prorrompe num hino de louvor e prostra-se em adoração: «adoramos, senhor, a vossa cruz e louvamos e glorificamos a vossa santa ressurreição. Pelo madeiro chegou a alegria para o mundo inteiro.» Com estes mesmos sentimentos, a liturgia convida os fiéis a alimentarem-se da eucaristia que, nunca como hoje, resplandece na sua realidade de memorial da morte do senhor: «este é o meu corpo entregue por vós; fazei isto em memória de mim» (Lc 22,19). «Sempre que comerdes deste pão e beberdes deste cálice, anunciareis a morte do senhor, ate que ele venha» (I Cor 11, 26).

Ó Cristo Jesus, caído sob o peso da Cruz, eu te adoro! «Força de Deus», mostraste-te abatido pela fraqueza para nos ensinares a humildade e confundir o nosso orgulho. Ó sumo-sacerdote, cheio de santidade, que passaste pelas nossas mesmas provações para seres semelhante a nos e poder compadecer-te das nossas fraquezas, não me abandones a mim mesmo porque sou apenas fraqueza; dá-me a tua força para não cair no pecado.

Salve, Cabeça ensanguentada, coroada de espinhos, ferida, golpeada com uma, cana, coberta de escarros! Salve! Sobre o teu manso rosto observa-se o prenúncio da morte; perdeu a sua cor mas, sob essa espantosa palidez, a corte celeste adora-te.

Ó sagrada face, assim ferida e atormentada pelos nossos pecados, faz com que aos olhos deste pecador indigno chegue e brilhe um sinal do teu amor! Pequei: perdoa-me! Não me rejeites. Enquanto se aproxima a morte, inclina um pouco para mim a tua cabeça adorável e deixa-a repousar entre os meus braços.

E, quando também eu tiver de morrer, vem depressa, ò jesus! Que nessa hora terrível, o teu sangue seja a minha ajuda! Protege-me e liberta-me! Partirei quando tu quiseres, meu amado jesus, mas, nesse momento, acompanha-me! Estreitar-te-ei contra mim porque me amas; mas, nesse momento, manifesta-te a mim nessa cruz que nos salvou!

Ó cruz, inexplicável amor de deus! Cruz, glória do céu! Cruz, salvação eterna! Cruz, terror dos malvados!

Amparo dos justos, luz dos cristãos, ó cruz, por ti, deus fito carne na terra, fez-se também escravo; por ti, no céu, o homem foi feito rei em Deus; por ti e de ti, nasceu a verdadeira luz, foram vencidas as trevas malditas.

Tu és o vínculo da paz que une todos os homens em cristo mediador. Tornaste-te escada pela qual o homem sobe ate ao céu.

RICARDO IGREJA

quarta-feira, 4 de abril de 2012

QUINTA-FEIRA SANTA

A Ceia do Senhor


«Como agradecerei ao Senhor tudo quanto Ele me deu?
Elevarei o cálice da salvação invocando o nome do Senhor»


1. A celebração do Mistério Pascal, centro e vértice da história da salvação, inicia-se com a Missa Vespertina da Quinta Feira Santa, que comemora a Ceia do Senhor.

Todas as leituras convergem para o tema da Ceia Pascal. O trecho do Êxodo (12, 1-8; 11-14) lembra-nos a instituição antiga, estabelecida quando Deus mandou aos Hebreus que, em cada família, fosse imolado «o cordeiro que há-se ser sem defeito; será macho e de um ano de idade», que se aspergissem, com um pouco de sangue, os dois umbrais e a padieira da porta para se libertarem do extermínio dos primogénitos, e que o comesse a toda a pressa e em treja de caminhantes. Naquela mesma noite, preservador pelo sangue do cordeiro e alimentados com a sua carne, começariam a caminhada para a terra prometida. O ritual deveria repetir-se ano apos ano lembrando o acontecimento. «É um sacrifício pascal em honra do Senhor» (Ex 12,11) que comemora «a passagem do Senhor» por entre o seu povo para o libertar da escravidão do Egipto.

Jesus escolhe a celebração da pascoa judaica para instituir a nova, a sua pascoa, em que ele é o verdadeiro «cordeiro sem defeito», imolado pela salvação do mundo. A partir do momento em que se senta a mesa com os seus, inicia o novo ritual. «O senhor jesus, na noite em que ia ser entregue – lê-se na segunda leitura (I Cor 11, 23-26), tomou o pão e deu graças; depois partiu-o e disse: «isto é o meu corpo que é para vós…». «No fim da ceia, fez o mesmo com o cálice e disse: «este cálice é a nova aliança nomeu sangue». Aquele pão miraculosamente convertido no corpo de cristo e aquele cálice que já não contem vinho, mas sim o sangue de cristo, ambos oferecidos, mas por separado, eram, naquela noite, o anúncio e a antecipação da morte do senhor em que derramaria todo o seu sangue e são hoje o seu memorial. «Fazei isto em memória de mim». Com esta luz apresenta S. Paulo a Eucaristia ao afirmar: «sempre que comerdes este pão e beberdes este vinho, anunciareis a morte do senhor». A eucaristia é o «pão vivo» que da a vida eterna aos homens (Jo 6, 51), porque é o memorial da morte de cristo, porque é o seu corpo entregue em sacrifício, e é o seu «sangue derramado por todos para o perdão dos pecados» (Lc 22, 19; Mt 26, 28). Alimentados com o corpo de cristo e banhados no seu sangue, os homens podem enfrentar as asperezas da viagem terrena, passar da escravidão do pecado para a liberdade dos filhos de deus, da travessia fatigante do deserto para a terra prometida: a casa do pai.


2. «Tomai e comei todos: isto é o Meu Corpo… Tomai e bebei todos: este é o Cálice do meu sangue». Se a rotina tivesse minorado a vitalidade da fé nos crentes, a liturgia deste dia convida-os a reaviva-la, a penetrar, com o mais profundo e amoroso olhar, na inefável realidade do mistério que, pela primeira vez, se realizou no Cenáculo diante dos olhares atónitos dos discípulos e que se renova hoje, da mesma maneira concreta de então. É o senhor Jesus que continua, na pessoa do seu ministro, a realizar o gesto consecratório e, hoje, aniversário da instituição da Eucaristia e véspera da morte do senhor, tudo isso adquire uma atualidade impressionante.

Jesus «que amara os seus…, amou-os ate ao fim» diz S. Paulo prolongando a narração da Ultima Ceia (3ª Leitura; Jo 13, 1-15): «e na noite em que ia ser entregue», precisa S. Paulo referindo a instituição da eucaristia. Que tremendo contraste! Por um lado, o amor infinito de Cristo, «até ao fim», ate a morte; por outro, da parte dos homens, a traição, a negação, o abandono. A eucaristia é a resposta que o senhor da a traição das suas criaturas. Parece estar impaciente para salvar os homens, tao fracos e perjuros, e antecipa, misticamente, a sua morte oferecendo-lhes, como alimento, esse corpo que dentro de pouco será sacrificado na cruz e esse sangue que derramara ate a ultima gota. E se, dentro de poucas horas, a morte a ira arrebatar da terra, na eucaristia perpetuara a sua presença viva e real ate ao fim dos tempos.

Juntamente com o sacramento do amor, jesus deixou à sua igreja o mandamento do amor: o seu «mandamento novo». Sem o esperarem, os doze deparam com o mestre a ajoelhar-se diante de cada um deles na atitude de escravo. «Deitou água na bacia e começou a lavar os pés aos discípulos». A cena acaba com uma advertência: «se eu vos lavei os pés, sendo senhor e mestre, também vos deveis lavar os pés, uns aos outros». Não se trata tanto de imitar o gesto material, quanto a atitude de humildade sincera nas relações reciprocas, considerando-se e comportando-se uns como servos dos outros. Só esta humildade faz possível o cumprimento do preceito que jesus vai impor: «dou-vos um mandamento novo: amai-vos uns aos outros como eu vos amei». O lava-pés, a instituição da eucaristia, a morte na cruz, manifestam como se deve amar os irmãos para realizar e fazer verdadeiro o preceito do senhor.

Ó bom jesus! Para nos exercitar no amor tomaste a resolução de permanecer sempre entre nós… no entanto, já preciseis a sorte que vos esperava entre os homens, as injurias e ultrajes que teríeis de sofrer. Ó eterno pai, como pudeste permitir que o vosso filho permanecesse no meio de nos para sofrer, dia apos dia, um novo género de injúrias? O meu deus! Que excesso de amor naquele filho! E que excesso também naquele pai!

Ó eterno pai! Como aceitastes que o vosso filho ficasse em mãos tao inimigas como as nossas? É possível que a vossa ternura permita que esteja exposto a tao maus tratos? Porque há-de ser todo o nosso bem a sua custa? Não haverá quem fale por este amantíssimo cordeiro?

Ó pai santo que estas no céu!... Se o vosso filho divino não deixou nenhuma coisa por fazer para nos dar a nos, pobres pecadores, um dom tao grande como o da eucaristia, não permitais, misericordiosíssimo senhor, que seja tao maltratado. Ele ficou entre nos de maneira tao admirável que o podemos oferecer em sacrifício sempre que queremos. Pois bem; que por este augustíssimo que se cometem ate no próprio lugar onde mora este santíssimo sacramento.

É verdadeiramente nosso dever, é nossa salvação dar-vos graças sempre e em todas a parte, por cristo nosso senhor. Verdadeiro e eterno sacerdote, oferecendo-se a vos como vitima de salvação, instituiu o sacrifício da nova aliança e mandou que o celebrássemos em sua memoria para que, tomando o pão da vida neste banquete sagrado, anunciemos a sua morte, enquanto esperamos a sua vinda gloriosa.

Concedei senhor que deste tao grande mistério possamos haurir a plenitude do amor e da vida.

Vem jesus; tenho os pés sujos. Faz-te servo por mim. Deita água na bacia. Vem lavar-me os pés. Bem sei que é uma temeridade o que te digo, mas temo a ameaça das tuas palavras: «se não te lavar os pés, não terás parte comigo». Lava-me, pois, os pés, para que tenha parte contigo. Mas, que digo? Lava-me os pés? Isto pode dize-lo Pedro que não precisava de lavar senão os pés, porque estava limpo. Eu, pelo contrário, depois de lavado, preciso desse outro batismo de que tu falar, senhor: «tenho que passar por um batismo»

RICARDO IGREJA

terça-feira, 3 de abril de 2012

QUARTA-FEIRA SANTA

Hora das Trevas


«Senhor, tende compaixão!
Curai-me, já que pequei contra vós»


1. «Em verdade vos digo que um de vós há-de entregar-me» (Jo 13, 21; Mt 26, 21). Não era somente Pedro que desejava saber quem seria o traidor, pois os outros estavam também ansiosos por sabe-lo e «profundamente contristados, começou cada um a perguntar-lhe: Serei eu, Senhor?» (Mt 26,22). O próprio Judas se atreve a fazer a mesma pergunta. Jesus revelara-o ocultamente a João: «é aquele a quem eu der o bocado que vou molhar» (Jo 13, 26) e, à pergunta de todos, respondera indiretamente: «aquele que meteu comigo a mão no prato é que há-de entregar-me» (Mt 26, 23). Mas Judas, que, com cínico desembaraço se senta à mesa como amigo, enquanto maquina a traição e aceita, sem tremer, o acusador pedaço de pão untado, não consegue permanecer encoberto; ele mesmo provoca a denúncia: «serei eu, mestre?»; e Jesus respondeu-lhe: «é como disseste».

O mestre vê-se assim, obrigado a falar abertamente dizendo o que ate então tinha silenciado com grande delicadeza. Mesmo conhecendo as intenções de judas, jesus tinha-o escolhido e amado como aos outros e tinha-o advertido também; as palavras pronunciadas perto de um ano antes: «não fui Eu que vos escolhi a vós, os doze? E contudo um de vós é um demónio» (Jo 6, 70), tinham sido ditas por ele para o prevenir. Durante a Ceia, para o designar, o Senhor recorreu a um gesto de amizade – o pedaço de pão untado e oferecido – que pretendia ser um chamamento silencioso; e no jardim das oliveiras, fara uma última tentativa para o afastar do abismo, não rejeitando mas aceitando o beijo do traidor. Mas judas já esta possuído pelo maligno, a quem se entregou por trinta moedas de prata. E jesus vê-se na obrigação de declarar: «o filho do homem vai partir… mas ai daquele por quem o filho do homem vai ser entregue!» (Mt 26, 24). Palavras serias que manifestam a tremenda responsabilidade do traidor. Judas seguira o Mestre, não por amor, mas por egoísmo, com a intenção posta em interesses materiais: a cobiça fê-lo ladrão: começou roubando algumas moedas e depois atraiçoou, por algumas moedas Aquele que já não lhe interessava, porque não lhe inspirava confiança alguma em vantagens materiais. Assim se faziam verdadeiras as palavras do Salmo: «ate o meu íntimo amigo em quem confiava e que repartia do meu pão, levantou contra mim o calcanhar» (Si 41,10).

2. «É por causa de vós que tenho suportado afrontas, cobrindo-se meu rosto de confusão… o insulto despedaçou-me o coração e eu desfaleço. Esperei por compaixão e não apareceu, nem encontrei quem me consolasse» (Salmo 69, 8.21). Nos dias consagrados ao mistério da Paixão, as palavras do salmista ecoam como uma lamentação de Cristo, exposto à infâmia, caluniado e torturado, abandonado por todos, atraiçoado pelos amigos: «Esta é a vossa hora e o domínio das trevas» (Lc 22, 53), disse Jesus no momento da sua prisão. A hora em que a traição se faz entrega aos tribunais, condenação à morte, crucifixão. Mas é também a hora marcada pelo pai para a consumação do Seu sacrifício e, por conseguinte, a hora esperada por Cristo com desejo ardente: «tenho de receber um batismo (o batismo do sangue da sua paixão) e que angustias as minhas ate que ele se realize!» (Lc 12, 50); e também: «tenho ardentemente desejado comer convosco esta pascoa, antes de padecer»; era a antecipação da pascoa do seu sacrifício na ceia eucarística.

O sacrifício de Cristo previa um traidor nas escrituras. No entanto, estas não especificaram o género de traição. Mas anunciaram-na, com precisão, porque assim tinha que acontecer. Mas nem por isso se pode considerar isento de culpa o homem que, voluntariamente, se fez traidor. «Que poderá aduzir judas, a não ser o pecado? – afirma S. Agostinho -. A o entregar Cristo nas mãos dos judeus, ele não pensou certamente na nossa salvação, pela qual Cristo se deixou entregar ao poder dos inimigos. Judas pensou no dinheiro que poderia ganhar e encontrou nele a ruina da sua alma». O ato infame serviu nos planos de Deus para levar Cristo à paixão. «Judas entregou cristo e cristo entregou-se por si mesmo: judas para concretizar a sua horrível traição e cristo para realizar a nossa redenção» A paixão de Cristo, ate nesta concorrência de causas divinas e humanas é um mistério inefável; é preferível contemplá-lo na oração a considera-lo segundo a logica humana. Todos os homens recebem a sua advertência, pois em cada um se pode esconder um traidor. Mas o perdão concedido a pedro e ao bom ladrão ai esta para testemunhas que no coração destroçado de cristo, há um amor infinito, capaz de destruir qualquer pecado confessado e chorado.

Ó jesus, como foi excessiva a tua bondade para com o mau discípulo! Ainda que não me expliques a maldade do traidor impressiona-me infinitamente mais a tua dulcíssima mansidão. Ó cordeiro de Deus! Essa mansidão é-nos oferecida a nós como modelo Eis aqui, ó senhor, que o homem das confidências únicas, o homem que parecia tao unido a ti, teu conselheiro e teu íntimo, o homem que saboreou o teu pão, o homem que na santa ceia comeu contigo os doces manjares, esse homem descarregou contra ti o golpe da iniquidade. E, não obstante…, Tu, mansíssimo cordeiro…., não vacilaste em entregar o teu rosto aos lábios maliciosos, aos lábios que no momento da traição, te beijaram… nada lhe poupaste, nada lhe negaste para poder suavizar a pertinácia de um mal coração.

Ó Bom Jesus; quanto são os que te ofendem com golpes! Golpeia-te o teu pai, porque não te perdoou, mas entrego-te como vitima por todos nos. Golpeia-te tu mesmo, oferecendo a morte a tua vida que ninguém te pode tirar se tu não quiseres. Golpeia-te além disso, o discípulo que te atraiçoa com um beijo. Golpeia-te o judeu com pontapés e bofetadas; e golpeiam-te os gentios com açoites e cravos. Olha: quantas pessoas, quantas humilhações, quantos verdugos!

E quantos os que te entregam! O pai celeste entrego-te por todos nos; e tu entregas-te a ti mesmo, como alegremente cantava S. Paulo: amou-me ate se entregar por mim. Que troca tao maravilhosa! Entregou-se a si mesmo: o senhor pelo servo: o inocente pelo pecador.

Benigníssimo senhor! Como poderei agradecer-te o teres-me suportado, a mim que agi mil vez pior do que judas? Fizeste-lo teu discípulo; a mim, tua esposa e filha… ó meu jesus! Eu atraiçoei-te, não uma vez apenas, mas infinitas vezes… quem te crucificou? Eu. Quem te açoitou atado a coluna? Eu. Quem te coroou de espinhos? Eu. Quem te deu de beber fel e vinagre? Eu. Senhor, saber porque te digo todas estas coisas? Porque compreendi… com a tua luz que mais te afligiram os meus pecados mortais do que todos aqueles tormentos.

RICARDO IGREJA

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