domingo, 6 de maio de 2012

MÃE

17.08.1926 - 03.03.2009
* CARTA À MINHA MÃE
Como não pensar em ti, mãe, no dia em que para mim, como para muitos, continua a ser o verdadeiro Dia da Mãe?

Partiste a 03.03.2009, há três anos, mas nem assim me esqueço de ti.

Sei, mãe, que por aí, a contragosto meu, os dias continuam frios e um pouco escuros demais.

Outrora, mas não há muito, há três Primaveras, por exemplo, os ossos doeram-te na mesma, as rugas denunciavam os mesmos dias de dureza, passado e presente, os achaques eram os mesmos, o sono foi curto como sempre. Mas o frio não era o mesmo. E não falo assim por causa destes líquidos dias de chuva intermitente e fria.

Falo assim, porque também eu tenho mais frio neste percalço de Primavera 2012.

Desde que me lembro nunca passei tanto frio como nos últimos dias. E não sei como nem porquê, ele aumenta quando me lembro que hoje é o Dia da Mãe! Sei bem que o Dia da Mãe são todos os dias, todos os dias, todos os dias mesmo, mãe.

Ainda me lembro do teu rosto sem rugas. Ainda me lembro do teu passo ágil, ligeiro. Ainda me lembro dos teus braços fortes. Ainda me lembro que nesse tempo de sol quente não havia Dia da Mãe. Porque tu eras mãe todos os dias! Eu e os meus irmãos tivemos mãe todos os dias, embora por vezes incompreendida. Mas agora há Dia da Mãe, talvez porque haja mais coisas para comprar para mães a menos. Ou com tempo a menos.

Sim, mãe, até partires não me falhou. Mas também até partires não senti tanto frio como sinto hoje.

Tinhas as tuas ideias e um caminho para escoá-las. Lembro-me bem, sobretudo, da tua época áurea, a época dos teus sonhos, dos nossos sonhos, dos meus sonhos. Lembro-me bem que começou a amanhecer. E no amanhecer fui buscando o meu caminho, enfrentando novos horizontes, acaudalando sonhos diferentes, prespectivando novas soluções, buscando outras águas, outros prados, outros rumos.

Começaste aí a ser mais mãe. Vias-me de longe e sobretudo de longe a longe. Mas vias-me, e eu sei que os filhos gostamos que as mães nos vejam quando procuramos equilibrar-nos nos primeiros andamentos de bicicleta.

Não nasci, como bem sabes, para ficar no ninho ou por perto dele. E a bicicleta levou-me por vezes para longe de ti. Mas tem piada! Agora lembro-me quando por vezes pegavas no telefone e me ligavas e começavas: «Querido Filho…», e essa voz continuo a ouvir no tempo e a sentir a tua presença, sempre preocupada no meu dia-a-dia.

Sim, já partiste, e é esse frio de que tanto me custa falar, porque não estava habituado a ele. E, meu Deus, como hei-de habituar-me? Ah, mas que fogo me há-de aquecer com a sua ausência?

Agora voltas a ser novamente mãe e pai. Não foi assim que cresci, vendo-te a fazer girar a mó do moinho e a pegar na rabiça do arado? Agora, porém, as tuas mãos já não têm força e esmaeceram sob o sol fresco da Primavera. Peço por isso a Deus, a Quem elas se vão elevando, para me abençoar, abençoar os filhos e netos, os nossos sonhos, as nossas labutas e combates.

Agora que voltas a ser mãe e pai, lembro-me bem das curvas do teu colo, do teu regaço onde sabia bem adormecer, quando lá jamais trepavam dragões, porque desde lá jamais se viam fantasmas ou guerras, jamais se sentia medo ou terror algum.

Agora que voltas a ser mãe e pai, quero lembrar-me bem que foi à lareira do teu colo que eu aprendi a ter fé, que primeiro amei Jesus e Maria, José, os Santos que estavam por toda a casa, o Santo Padre e a Bíblia.

Agora que voltas a ser mãe e pai, oro duplamente por ti ao Pai. Rezo-lhe para que vele por ti, que é o mesmo que velar por nós.

Fico sem palavras agora que voltas a ser mãe e pai. Di-las-ei qualquer dia, num outro qualquer Dia da Mãe.

Onde quer que estejas, algures no Céu, mãe, recebe um beijo sentido deste teu filho e não deixes de continuar a velar por mim.

HÉLDER GONÇALVES

Sem comentários:

Enviar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...