As
testemunhas da Cruz e da Ressurreição de Cristo transmitiram à Igreja e à
humanidade um Evangelho específico do sofrimento. O
próprio Redentor escreveu este Evangelho; em primeiro lugar, com o seu
sofrimento assumido por amor, a fim de que o homem "não pereça, mas
tenha a vida eterna". Este sofrimento, juntamente com a palavra
viva do seu ensino, tornou-se uma fonte abundante para aqueles que participaram
nos sofrimentos de Jesus na primeira geração dos seus discípulos e confessores.
E
é consolador - como é também evangélica e historicamente exacto - notar que ao
lado de Cristo, em primeiríssimo lugar e bem em evidência junto dele, se
encontra sempre a sua Mãe santíssima, porque com toda a sua vida
ela dá um testemunho exemplar deste particular Evangelho do
sofrimento.
Em
Maria, os sofrimentos, numerosos e intensos, sucederam-se com tal conexão e
encadeamento, que bem demonstram a sua fé inabalável; e foram, além disso, uma contribuição
para a Redenção de todos.
Na
realidade, desde o colóquio misterioso que teve com o anjo, Ela entrevê na sua
missão de mãe a "destinação" de compartilhar, de maneira única
e irrepetível, a mesma missão do seu Filho. E teve bem depressa a confirmação disso,
quer nos acontecimentos que acompanharam o nascimento de Jesus em Belém, quer
no anúncio explícito do velho Simeão, que lhe falou de uma espada bem afiada
que haveria de trespassar-lhe a alma, quer, ainda, na ansiedade e nas privações
da fuga precipitada para o Egipto motivada pela decisão cruel de Herodes.
E
mais ainda: depois das vicissitudes da vida oculta e pública do seu Filho, por
ela certamente partilhadas com viva sensibilidade, foi no Calvário que o
sofrimento de Maria Santíssima, conjunto ao de Jesus, atingiu um ponto culminante
dificilmente imaginável na sua sublimidade para o entendimento humano; mas,
misterioso, por certo sobre-naturalmente fecundo para os fins da salvação universal.
A sua subida ao Calvário e aquele seu “estar” aos pés da Cruz com o discípulo
amado foram participação muito especial na morte redentora do Filho, assim como
as palavras que ela pôde escutar dos lábios de Jesus foram como que a entrega
solene deste Evangelho particular, destinado a ser anunciada a toda a
comunidade dos fiéis.
Testemunha
da paixão pela sua presença, nela participante com a sua compaixão, Maria
Santíssima ofereceu uma contribuição singular ao Evangelho do sofrimento
no início desta reflexão. Sim, Ela tem títulos especialíssimos para poder
afirmar que "completa na sua carne - como igualmente no seu coração
- aquilo que falta aos sofrimentos de Cristo".
À
luz do inacessível exemplo de Cristo que se reflecte com uma evidência singular
na vida da sua Mãe, o Evangelho do sofrimento,
através da experiência e da palavra dos Apóstolos, torna-se fonte inexaurível
para as gerações sempre novas, que se sucedem na história da Igreja.
O
Evangelho do sofrimento significa não apenas a presença do
sofrimento no Evangelho, como um dos temas da Boa Nova, mas também a revelação
da força salvífica e do significado salvífico do sofrimento na missão
messiânica de Cristo e, em seguida, na missão e na vocação da Igreja.
Cristo
não escondia aos seus ouvintes a necessidade do sofrimento. Pelo contrário
dizia-lhes muito claramente: "Se
alguém quer vir após mim... tome a sua cruz todos os dias"; e
aos seus discípulos punha algumas exigências de ordem moral, cuja realização só
é possível se cada um se "renega a si mesmo".
E
não é tudo: o divino Redentor quer penetrar no ânimo de todas as pessoas que
sofrem, através do coração da sua Mãe Santíssima, primícia e vértice de todos
os redimidos.
Como
que a prolongar aquela maternidade, que por obra do Espírito Santo lhe havia
dado a vida, Cristo ao morrer conferiu à sempre Virgem Maria uma nova
maternidade – espiritual e universal – em relação a todos os homens, a fim de
que cada um deles, na peregrinação da fé, à semelhança e junto com Maria, lhe
permanecesse intimamente unido até à Cruz; e assim, todo o sofrimento,
regenerado pela virtude da Cruz, de fraqueza do homem se tornasse força de
Deus.
(João
Paulo II, Salvifici Doloris,
25-27)
Padre Castro
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