quarta-feira, 10 de setembro de 2014

De Jerusalém a Roma o Evangelho na actualidade

Jesus é crucificado na primavera do ano 30, perto dos muros de Jerusalém. Sobre a Cruz, uma placa: «Jesus de Nazaré, Rei dos Judeus». Pilatos, autor da placa, saberá ele que Roma ainda não acabou com este Galileu?


Jerusalém é uma pequena vila com cinquenta mil almas, talvez. Nas grandes festas, ela triplica a sua população. Mas Jerusalém não se mede só pela quantidade dos seus habitantes. É a Cidade Santa, dominada pelo seu Templo que atrai os judeus do mundo inteiro. Um belo edifício, parecido com uma montanha cheia de neve, por causa dos seus mármores, mais brilhante que o sol por causa dos revestimentos em ouro.

Jesus, Ele, cresceu numa aldeia obscura da Galileia. Mas o seu suplício liga-O à Cidade Santa. É aí que os seus discípulos anunciam a ressurreição. Pedro, João e os outros Apóstolos formam em breve em Jerusalém um núcleo estável de judeus adeptos de Jesus.
Eles não vivem a sua fé em Cristo ressuscitado contra a religião, mas como a sua fina flor. Eles continuam a ir ao Templo rezar mas não fazem ofertas de sacrifícios. Eles lembram-se das palavras de Jesus, e vivem à luz dos seus ensinamentos.

Jerusalém é uma encruzilhada. Os judeus «helenistas» (que falam Grego e não Aramaico como Pedro) também começam a acreditar em Jesus. Alguns até se mostram mais provocadores que os Apóstolos. Um deles, Estêvão vira-se para o Templo e diz: “Não façam da casa de meu Pai uma caverna de ladrões”, disse Jesus. “Deus não mora em casas construídas pelo homem”, proclama Estêvão. Ele vira-se assim contra o Templo de Jerusalém argumento utilizado contra os pagãos. Por causa destas palavras a sua coexistência com os judeus de Jerusalém tornou-se mais difícil. Estêvão foi apedrejado. Uma nova perseguição iniciou-se. Um mal que se torna num bem. A perseguição torna-se num teste. Os discípulos, à excepção dos doze apóstolos, abandonam Jerusalém, e vão levar a Boa Nova fora. As comunidades começam a nascer até Chipre e na Síria.


Antioquia, uma igreja cheia de vitalidade – Depois de Roma e Alexandria, Antioquia é a terceira cidade do Império, com mais de quinhentos mil habitantes. Uma comunidade implanta-se antes do ano 40. ela é composta por judeus e pessoas de outras nações chamadas de pagãos, Gregos ou gentios. Os que acreditam em Jesus não são todos judeus e passam a chamar-se de cristãos seja qual for a sua origem. A igreja de Antioquia não se parece com a de Jerusalém que acolhe menos pagãos. Mas Jerusalém fica como a igreja mãe. Os apóstolos enviam um delegado a Antioquia, chamado Barnabé, para observar o que se passa. As crianças crescem e reclamam a sua parte de autonomia. A jovem igreja de Antioquia quer mostrar-se reconhecida pela igreja mãe, mas não gosta que lhe digam o que tem que fazer. Uma grande fome atinge a Judeia. A igreja de Antioquia organiza uma colecta para ajudar os seus irmãos em Jerusalém. A colecta que esta jovem igreja organiza mostra que é capaz de gerar vida e que se porta bem. A relação entre as duas igrejas não é sentido único. A igreja de Antioquia torna-se uma verdadeira parceira. Barnabé instala-se em Antioquia, depois parte para Tarso à procura de Paulo. que acaba de converter-se. Com duas personalidades desta envergadura, a igreja fortifica-se. Em breve, ela ultrapassa em numero a de Jerusalém.
Como organizam-se eles? Quem dirige? Em Jerusalém estão os apóstolos. Mas em Antioquia quem está?  Esta igreja está largamente aberta às iniciativas do Espírito mas ela tira também da sua ligação a Jerusalém as riquezas duma tradição.

Encontramos, diz-nos Lucas, «os profetas e os homens de sabedoria». Os profetas desempenham nos primeiros cristãos um papel importante. Quando a igreja reza, ela vive da certeza que o Senhor ressuscitado está presente e espalha o seu Espírito, capaz de renovar todas as coisas. Durante as rezas litúrgicas, um profeta pode declarar: «Metam-me Barnabé e Paulo de lado para a obra que os destinei». E a comunidade envia em missão dois dos seus melhores elementos. Foi assim que Antioquia está na origem das viagens missionárias destes dois homens.

Mas como evitar as falsas iniciativas reivindicadas em nome do Espírito?
Em Jerusalém como em Antioquia, foi preciso aprender a fazer o discernimento. Os «homens encarregados de ensinar» têm aqui uma grande influência. Á volta dos apóstolos lembram-se do Mestre. Transmite-se os textos da última Ceia, da Paixão e da Ressurreição. Se algum profeta disser alguma coisa em nome do Espírito, este não pode estar em contradição com aquilo que Jesus fez e ensinou. Tradições formadas à volta dos apóstolos e abertura às iniciativas do Espírito confortando-se por formar igrejas vivas. A igreja de Jerusalém sente-se próxima dos judeus; a de Antioquia tem o carisma de se abrir largamente aos pagãos.


·       «Não há judeu nem grego, nem escravo nem homem livre»

Paulo e as suas igrejas – A igreja de Jerusalém e a igreja de Antioquia têm os seus missionários que percorrem o Império. Há Paulo o viajante infatigável, evangelizador das nações. Para ele, não é necessário converter-se ao judaísmo para se ser cristão. Ele funda Filipo, Tessalónica, Atenas (onde consegue pouco), Coríntio e várias igrejas na Galácia ou ainda em Éfaso onde outros missionários já trabalharam. Quando a igreja está reforçada, ele parte para outro local, deixando no local responsáveis, os mais antigos. Ele conserva laços graças ao correio e aos seus colaboradores, Timóteo, Silvino e Tito. Existe também Priscilia e Aquilas, um casal de judeus onde Prisca, a mulher, tem um grande papel ao serviço do Evangelho.

A sociedade do império romano está constituída por uma complexa teia de pessoas: escravos ou homens livres, habitantes duma cidade, estrangeiros, libertados, membros de confrarias, fraternidades religiosas à volta de um deus, duma deusa. Os filósofos Estóicos lembram que um escravo e um cidadão são homens e irmãos sobre o olhar da Providencia. Eles esforçam-se de tirar as consequências morais. Mas nos acontecimentos, a sociedade fica desigual. Ela parece uma pirâmide, no topo o imperador, os cidadãos, e depois as categorias mais baixas – os libertados e os escravos.

Esta organização social, a mensagem cristã transforma-os. Todas as diferenças apagam-se em nome da fraternidade. Todo o homem é um irmão pelo qual Cristo deu a Sua vida. Todos os homens são chamados pela fé a tornarem-se Filhos de Deus. «Não há mais, escreve Paulo, nem judeu nem grego, nem escravo nem homem livre, nem homem e a mulher».
Propósito de um sonhador? Propósito utópico de certeza. Mas a utopia começa a realizar-se dentro da igreja. O cidadão convive com o escravo, o judeu vive ao lado do grego. Os homens como as mulheres são acolhidos.

Todos irmãos. O convívio é delicado. Depois de alguns anos de existência cristã em Coríntio, o ideal está longe de ser atingido. Os cristãos reconstituíram grupos no interior da igreja. Cada um reivindica uma grande personalidade: «Eu, pertenço a Paulo». «Eu, a Apolo», «Eu, a Pedro». Paulo zanga-se: «Vocês não pertencem a ninguém deste mundo, escreveu. Vocês pertencem a Cristo que pertence a Deus». Tais propósitos contradizem a organização da própria sociedade. Em breve os cristãos aparecem como os subversivos. Propósitos maliciosos circulam a sujeito deles: estas pessoas que se dizem irmãos e irmãs não querem eles arruinar a célula familiar e favorecer o incesto?

Os cristãos não têm, durante os três primeiros séculos, imóveis públicos. Eles reúnem-se habitualmente nas suas casas, por vezes nos jardins ou nos cemitérios para honrar os seus mortos. Priscilia e Aquiles recebem a igreja em sua casa, em Roma. É preciso muitas qualidades para preencher este rol de acolhimento. E este casal não lhe falta. Não é a mesma coisa em Coríntio. As pessoas que recebem a igreja reconduzem com hábitos pagãos. Numa vila normal, uma dezena de pessoas podem ser recebidas numa sala de jantar; os outros contentam-se no átrio. A tentação é então grande de receber as pessoas honradas com o mestre na sala de jantar, e os escravos ou as outras pessoas no exterior. A ceia do Senhor, sinal de unidade, torna-se sinal de divisão. Paulo tem de por as coisas no sítio.


Roma, no coração do império

Viajamos muito na antiguidade. Por barco (é necessário 10 dias para ir de Roma a Alexandria). De carroça, sobre as estradas que o imperador Augusto melhorou. Para evitar aventuras dos albergues, bilhetes de recomendações permitem aos parentes ou amigos, espalhados pelo império, de acolher os viajantes.

Paulo recomenda aos seus colaboradores ou aos irmãos da igreja de Roma, Phoébé, uma diaconisa, a caminho da capital. Tais atenções desenvolvem amor fraternal de onde Paulo fala tão bem nas suas cartas.
Para os viajantes, a fé cristã chega muito cedo a Roma. Desde o ano 49, ela causa a expulsão, pelo imperador, dos judeus que disputam entre pertencerem ou serem adversários da nova fé. Os cristãos implantam-se solidamente em Roma mas vão em breve integrarem-se na igreja mãe de Jerusalém.

No ano de 66, a guerra dos judeus contra os Romanos começa. As legiões esmagam os revolucionários judeus, tomam Jerusalém e destroem o Templo. Que aconteceu aos cristãos?
Eles abandonaram a vila antes da guerra e foram estabelecerem-se em Pella, não muito longe da Galileia. Depois da guerra, uma igreja cristã reconstituiu-se em Jerusalém. Mas agora não tem o mesmo prestígio. As igrejas bem implantadas como Èfaso, Antioquia, Roma, tomaram a continuidade. E para muitos cristãos, a verdadeira Jerusalém encontra-se no Céu.

É nesta época que desaparecem os apóstolos. Só João, que a tradição liga-o à igreja de Èfaso, vive até muito velho. Pedro e Paulo são martirizados por Nero, metendo assim a igreja de Roma sobre o patronado de duas figuras prodigiosas. O tempo das origens, já muito longe. Mas os cristãos não entram na história sem fontes de origem. As cartas de Paulo circulam. As tradições formadas à volta dos apóstolos conduzem à redacção dos Evangelhos. Pode-se assim enfrentar o futuro, com livros que conservam a memória.

As igrejas desenvolvem-se. Lyon em Gaule, Cartago em África são evangelizadas. Os problemas não faltam. Como, por exemplo, acolher as pessoas de passagem? Mesmo com as cartas de recomendações, eles podem esconder-se dos abusadores e dos ladrões. Também dos que semeiam a discórdia. A Escritura, sem dúvida escrita em Antioquia, fornecesse regras bem precisas: «Se aquele que vem a vossa casa está só de passagem, ajudai-o do vosso melhor. Mas que ele só fique em vossa casa dois ou três dias. Se ele quer instalar-se em vossa casa mas que ele seja artesão, então que ele trabalhe e se alimente. Se ele não quiser agir assim, é um traficante de Cristo; guardai-vos das pessoas deste género».

É preciso precisar as condições para entrar na igreja. Existe profissões incompatíveis com a fé? Hipólito de Roma recomenda um inquérito antes de dar o baptismo, depois de três anos de aprendizagem. Ele dá a lista das actividades interditas: «Dormir dentro do circo, gladiadores, padre de ídolos, encantadores, astrólogos, intérprete de sonhos… O escultor está convidado a não esculpir ídolos, homem que tivesse uma amante e que parou».
Baptismo e Eucaristia constituem um tempo forte das comunidades. Os textos garantem o bom desenvolvimento. É preciso explicar o que se passa para evitar fábulas. Diz-se que os cristãos são uma seita secreta e que para entrar, é preciso espetar uma faca cheia de farinha nas costas de uma criança. Os cristãos são perseguidos e aniquilados. Os mais entendidos escrevem então cartas ao imperador. Firmemente, Justino, filosofo convertido, explica-se: «O dia em que chamarem ao dia, sol, todos devem reunirem-se num único e mesmo local. Lê-se as memórias dos apóstolos e os escritos dos profetas… a leitura acabada, o presidente toma a palavra para exortar a imitar estes bons ensinamentos».

Vem depois em seguida a oração em alta voz, e aquele que preside faz subir as orações quando se traz o pão e o vinho. Reparte-se os alimentos consagrados e envia-se os diáconos levar o pão aos ausentes. Leva-se os bens para entreajuda: «Aqueles que estão com abundância e que querem dar, dão livremente. O que é recolhido é metido nas mãos do presidente, e ele assiste aos órfãos, às viúvas, aos doentes, aos indigentes, aos presos, aos estrangeiros». Tertúlio testemunha das mesmas práticas na igreja em África: caixas comuns servem para socorrer os que precisam.


A sedução cristã

A igreja seduz quando ela oferece uma maneira de viver em fraternidade num mundo duro e cruel. Uma prática corrente é abandonar as crianças nas escadas dos Templos. Pessoas sem escrúpulos recolhem-nos então para os levar para a prostituição ou para os ateliers de escravos. «Nós não expomos as nossas crianças» afirma com honra Tertúlio.

Virá um dia onde os cristãos serão numerosos para atirar sobre si a atenção dos pensadores pagãos. Ano 180, o filósofo Celso escreve um livro contra eles. Ele acusa-os de recrutar nas baixas camadas da sociedade e de enviarem bom faladores a meterem-se com as mulheres atrás dos maridos, de presentear uma religião de fracos por pessoas crédulas.

Realmente, desde o nascimento, o cristianismo recruta em todas as camadas sociais. Lídia, que Paulo encontrou em Filipos, é uma mulher empresária. Eraste, da igreja de Coríntio, é tesoureiro da sua vila.

O sucesso do cristianismo provém desta capacidade tranquila a propor um estilo de vida diferente, a recusar o compromisso com um mundo julgado idolatra e duro, a socorrer os deixados por conta, a resolver os problemas da vida quotidiana.

Em Lyon, França, personalidades como Alexandre, um médico, e Atalle um notável, fazem parte da igreja. Para eles a evangelização progride junto daqueles que encontram.

No IIIº século, os cristãos estão presentes em todos os sectores da sociedade: ateliers, lojas, tropa. Mas as suas vidas tornam-se delicadas numa sociedade marcada pelo seu carácter religioso, com cerimónias aos deuses que eles já não honram.

Que se os persiga ou que se os deixe em paz, pergunta-se quem eles são verdadeiramente. A religião dos judeus é reconhecida pelo império. Os cristãos, não têm nenhum estatuto legal. Quem são eles? Nem judeus nem pagãos, dizem eles, nós inventamos uma outra maneira de viver. Nós praticamos o amor ao irmão em nome de Jesus. Todo homem pela fé é chamado a ser um filho amado de Deus.

Ser cristão no quotidiano -  A sociedade romana está marcada pelo seu carácter religioso. No tempo da república, contava-se 180 dias de descanso. Depois do imperador Calígula, a Saturnália dura sete dias: um dia para os deuses, seis dias para as extravagâncias (mascaradas, orgias, circo, etc…). a vida quotidiana é muito delicada para um cristão. O nascimento de uma criança, um casamento não acontece sem gestos culturais para os deuses. Ausentes das festas que acabam com orgias, jogos de circo e cerimonias nos templos mas também ausentes do teatro onde são representadas cenas imorais da mitologia, eles são rapidamente acusados de deslealdade cívica. Considerados como pessoas secretas, desconfia-se de práticas ocultas… uma das causas de perseguições. Os judeus, fiéis a uma religião secular, beneficiam, pensam eles, dum estatuto oficial que lhes permite de viver segundo os seus rituais.


Uma religião particular

«Deve ser um pregador de divindades estrangeiras» Foi assim que Paulo se viu entender qualificado pelos filósofos de Atenas a quem ele anunciou Jesus e a Ressurreição. Os seus auditores acreditaram sem dúvida a um novo casal de divindades estrangeiras vindos do Oriente – Cybele e Adónis, Isís e Osíris – muito na moda naquela época.
Ao lado dos deuses da cidade como Júpiter, Vénus, Minerve, prosperam os cultos estrangeiros, sírios, egípcios, ou até mesmo os vindos do Irão, como Mithra. 

Estes deuses parecem-se mais próximos e mais eficazes na conduta do destino de cada um.

É certo que o cristianismo foi recebido por pessoas cultas como uma das religiões estrangeiras. Justino, filósofo convertido, defende a originalidade do cristianismo. Ele acusa os seguidores de Mithra de copiarem os cristãos ao fazerem nascer o seu deus numa gruta e comendo pão e vinho nas suas refeições na confraria. De facto, o cristianismo é uma religião muito particular que rejeita a existência de outros deuses, daí a acusação do ateísmo, e afirma a sua originalidade pela fé na ressurreição da carne e na vinda de Cristo no fim dos tempos. A igreja de Corinto, é o tesouro da sua vila. 

O sucesso do cristianismo provém desta capacidade tranquila de propor um novo estilo de vida diferente, a recusar o compromisso com um mundo julgado idolatra e duro, a socorrer os abandonados, a resolver os problemas da vida no quotidiano. Em Lyon, as personalidades como Alexandre, um médico, e Atalle um notável, fazem parte da igreja. para eles, a evangelização progride junto de todos com quem se encontram. No IIIº século, os cristãos estão presentes em todos os sectores da sociedade; ateliers, lojas, exército, etc… mas as suas vidas são delicadas numa sociedade marcada pelo seu carácter religioso, com as suas cerimónias aos deuses que eles já não honram. Que os persigam ou que os deixem em paz, pergunta-se quem são eles verdadeiramente. A religião dos judeus é reconhecida pelo império. Os cristãos não têm nenhum estatuto legal. Quem são eles?
Nem judeus nem pagãos, dizem eles, nós inventamos uma outra maneira de viver.
Nós praticamos o amor ao próximo, em nome de Jesus. Todo homem pela sua fé é chamado a ser um filho amado de Deus.


Alexandria, a capital intelectual

Alexandria é a segunda maior cidade do império romano. Alexandria brilha pelos seus pensadores, pelos seus filósofos e pela sua cultura. Uma comunidade judaica muito próspera instala-se desde a origem. É através dela que chega a fé cristã. Apollo, que evangeliza na região de Èfaso e Corinto, é um judeu convertido em Alexandria.

A igreja de Alexandria desenvolve desde muito cedo o diálogo com os filósofos pagãos. Panténe funda uma escola de catequese. Pagãos cultos apressam-se às aulas, sobretudo às de Origine, um dos maiores pensadores cristãos. Foi Pantène que escreveu a maravilhosa epístola a Diognete? Talvez. O que a alma é ao corpo, os cristãos o são para o mundo. Eles vivem no meio das cidades, eles respeitam as leis, mas a verdadeira cidade é o Céu: «Toda a terra estrangeira é-lhes uma pátria e toda a pátria é-lhes estrangeira. Eles casam-se como todas as pessoas, eles têm filhos, mas eles não abandonam os recém-nascidos. Eles partilham todos a mesma mesa, mas não a mesma cama. Eles passam a vida sobre a terra, mas são cidadãos do Céu. Eles obedecem às leis estabelecidas e a sua maneira de viver enquadra-se perfeitamente nas leis».

Com fortes caracteres como Clemente, Origine e, no IVº século, Cyrille, Alexandria encontra-se em breve em rivalidade com Antioquia nos debates teológicos que não faltam dentro das igrejas. Rivalidades e rupturas. Já o Novo Testamento chamava a atenção dos falsos doutores. As igrejas são jovens e as crenças borbulham.

Cristo é igual ao Pai? É um verdadeiro homem ou simplesmente uma aparência? Um Deus pode morrer numa cruz? Os debates são numerosos e os participantes apaixonados. Os responsáveis das igrejas, teólogos e pastores, desenvolvem um grande papel na solução dos problemas. Uma nova organização de hierarquia desenha-se. Vê-se emergir à cabeça da igreja um único responsável – um bispo – rodeado dos seus padres e dos seus diáconos. Esta igreja de Antioquia fornece o primeiro testemunho desta organização hierárquica. O bispo Inácio não dá a ninguém a suas responsabilidades. Só quando na viagem que o conduz a Roma onde ele deve ser lançado aos leões, ele escreve às igrejas, ele encoraja, ensina, avisa-os. Ele chama a atenção a aqueles que querem retornar aos rituais dos judeus ou ainda àqueles a quem recusam que «a eucaristia é a carne do nosso salvador Jesus Cristo, carne que sofreu pelos nossos pecados e que na sua bondade o Pai ressuscitou-O».

Eis uma grande questão dos crentes: o Filho de Deus pode tornar-se carne? O corpo, o mundo material merece de ser tido em consideração pelo Filho de Deus? Não, respondem os cristãos gnósticos. Os doutores Basilde ou Valentim, atribuem a criação a um deus inferior. A salvação não está na redenção do mundo e da carne, mas consiste em subir até Deus pelo conhecimento interior, para encontrar uma unidade perdida. O Egipto e Alexandria são uma terra favorável aos gnósticos. Mas também África, a Síria e Roma. Irineu, bispo de Lyon, encontra-os na sua região. Ele combate-os com força, desenvolvendo a fidelidade à tradição dos apóstolos.

Quando termina o tempo dos primeiros cristãos, no IVº século, as igrejas estão espalhadas por todo o império. Com a conversão do imperador Constantino, elas já não receiam as perseguições. Elas são a prova duma grande vitalidade e ricas de mártires. A comunhão estabelece-se entre as igrejas, mas os motivos de divisão e de querelas não faltam. È a razão pela qual os bispos decidiram tornar-se um hábito reunir-se em concílios para resolver os problemas que vão aparecendo.

As grandes heresias propagam-se no arianismo que tomará uma volta politica e dividirá o império durante alguns séculos.

De facto, um novo desafio anuncia-se às igrejas no império que se tornou cristão. No tempo das perseguições, Roma era vista como uma prostituta, uma besta insaciável do sangue dos mártires.
Com Constantino, e depois com Teodoro metem fim aos cultos pagãos, e o cristianismo foi infelizmente embora ligados ao poder político. As igrejas saberão elas agora conservar o ideal de fraternidade, em nome de Jesus, o Messias morto e ressuscitado?

HÉLDER GONÇALVES

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