sábado, 18 de agosto de 2012

MULHER...UM DOM

A emancipação da mulher é uma notável conquista dos tempos modernos. Há 50 anos, o Concílio Vaticano II, ao descrever a condição do homem no mundo, no esforço por investigar “os sinais dos tempos, e interpretá-los à luz do Evangelho”, observava que “as mulheres reivindicam, onde ainda a não alcançaram, a paridade de direito e de facto com os homens” (GS 9). Felizmente, muito se avançou no sentido do reconhecimento da igual dignidade e direitos dos homens e das mulheres. No entanto, a situação de igualdade da mulher ainda não é respeitada sempre e em toda a parte, o que requer a continuidade do esforço por parte de todos em ordem a termos uma sociedade justa, fraterna e democrática.

No contexto de luta pela igualdade, soam estranhas e provocam reação e rejeição as palavras de S. Paulo quando exorta as mulheres a submeterem-se aos maridos (cf Ef 5, 21-33). É certo que o apóstolo convida os cristãos a submeterem-se ou subordinarem-se “uns aos outros” por causa da fé em Cristo, e os maridos a amarem as suas mulheres “como Cristo amou a Igreja e se entregou por ela” e como se amam a si mesmos. D. Anacleto Oliveira, bispo da Diocese de Viana do Castelo, interpretando esta passagem bíblica no sentido do amor recíproco e da relação de todos com e em Jesus Cristo, esclarece: “só na medida em que todos a Ele se subordinam, é que a todos é dito, incluindo aos maridos: ‘subordinai-vos uns aos outros’. Pelo Batismo, todas as diferenças deixam de ser motivo de exclusão e opressão. Mais: cada cristão deve considerar os outros superiores a si mesmo… nas suas diferenças, incluindo as de organização social”. Então, se marido e esposa estão unidos em Cristo e se amam ao modo d’Ele, “a subordinação dela deixa de se basear em normas sociais, mas na comunhão com Cristo, de que também participa o marido” (Cf “Um ano a caminhar com S. Paulo”, p. 89).

Pegando nas referidas palavras de S. Paulo e interpretando-as em sentido não comum nem óbvio, Costanza Miriano, jornalista da televisão pública italiana, escreveu o livro com o título polémico e provocatório: “Casa-te e sê submissa: prática extrema para mulheres sem medo”. O curioso é que teve êxito de vendas e deu bons frutos em muitas mulheres, que passam o livro de mão em mão. A autora está convencida de que hoje muitos conflitos matrimoniais poderão resolver-se se a mulher entender o seu verdadeiro talento de esposa e mãe: a submissão do serviço, a sua capacidade de mediar, de unir, em vez de dividir.

O ponto de partida do seu livro foram as conversas ao telefone com uma amiga, tentando convencê-la a casar-se, pois poderia ser feliz com o seu noivo. Deu-se conta de que há mulheres que têm expectativas irreais e ideias erradas sobre o amor e o matrimónio. Para ela, a palavra submissão que usa S. Paulo situa-se não na lógica do poder mas “do serviço recíproco, que é o serviço a que está chamada a mulher”. O homem, por seu lado, “está chamado a servir de maneira diferente: deve estar pronto a morrer pela sua esposa, como Cristo morreu pela Igreja”. Para a mulher, ser submissa, no sentido paulino, “significa, literalmente, estar por debaixo para ser suporte de todos os membros da família, para acompanhar os mais débeis”.

À pergunta se uma mulher assim submissa pode ser feliz, Costanza Miriano responde: “É um verdadeiro talento. Podemos trabalhar e ter muito mais êxito, porém o que melhor sabemos fazer e o que responde aos desejos mais profundos do nosso coração é essa capacidade se servir e unir as pessoas. O amor da mulher é mais altruísta e leva o homem a sair de si, enquanto a mulher recebe (a relação física é uma representação do espiritual). Os homens e as mulheres necessitam de recuperar esses talentos específicos, pois complementam-se entre si”.

No livro, escrito com muito humor e leveza, a autora, casada e mãe de 4 filhos, deixa conselhos às esposas: que saibam acolher com doçura e paciência os maridos, que os olhem de modo positivo e saibam aceitar o bem que há neles, que saibam controlar a própria língua e guarda certas coisas para dizer no momento mais oportuno, a não ficarem num amor apenas sentimental mas de decisão, que saibam aceitar as próprias limitações e as do marido. Fala também da missão de mãe. Diz que é um erro as mães não saberem ser firmes e terem medo de causar frustrações nos filhos. Isso causa neles insegurança e indecisão. Deverão ser mais naturais e menos ansiosas na relação com eles.

Depois da atenção às esposas e mães, Costanza volta-se agora para os maridos e prepara um livro sobre eles. Analisa a frase de S. Paulo: “Maridos, estai prontos a dar a vida pelas vossas esposas”. Entende que “se a mulher tende a controlar tudo, o homem tende para o egoísmo”. Por isso, as palavras do apóstolo são apelo ao heroísmo dos maridos.

O apelo do livro não é o de recuperar o passado de domínio do homem sobre a mulher mas o de exortar ambos a viverem a relação de amor na reciprocidade dos dons: cada um oferece o seu dom próprio e acolhe o do outro, valorizando-o como o seu. Assim conjugam igualdade no valor e na dignidade de ambos com a diferença de talentos, sensibilidades e modo de ser com que se fazem felizes um ao outro e à própria família.

HÉLDER GONÇALVES

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