A 2 de Novembro, a Igreja recolhe-se em
oração pelos seus filhos que já partiram desta vida. Para os cristãos, não se
trata de um simples dia de saudade, mas de oração pelos fiéis de Cristo que já
partiram para a Casa do Pai na firme esperança da ressurreição.
Vêm à nossa mente e ao nosso coração
tantas perguntas:
Que é a morte?
Que é a vida que termina com a morte?
O que há após a morte?
São interrogações que devemos responder à
luz da fé.
Num mundo que já não crê e não tem quase
nada a dizer sobre a vida e sobre a morte, a Palavra de Deus ilumina-nos: “Irmãos, não queremos que ignoreis o que
se refere aos mortos, para não ficardes tristes como os outros, que não têm
esperança” (1Ts 4,13).
O cristão não pode
encarar a morte como os pagãos; nós temos uma esperança, e ela se chama Jesus
Cristo, aquele que disse “eu sou
a Ressurreição, eu sou a Vida” (Jo 11,25)!
Recordemos algumas certezas fundamentais
da nossa fé:
(1) Deus é vida, criou tudo para a vida. Ele não é o
autor da morte, não entende nada de morte, não tem parte com a morte (cf. Sab
1,13-15). Pelo contrário, a morte é a separação do Deus da vida, como as trevas
são a separação da luz do sol. “Deus criou o homem para a incorruptibilidade e o fez
imagem da sua própria natureza; foi por inveja do Diabo que a morte entrou no
mundo: experimentam-na aqueles que lhe pertencem” (Sab 2,23s). Deus pensou para nós somente o bem e a
felicidade com Ele! O homem, ao fechar-se desde o princípio, para o Deus da
vida, desarrumou-se, desaprumou-se e passou a experimentar a sua vida como uma
morte: desequilíbrio, dor, egoísmo, solidão, medo, doença, falta de sentido e,
finalmente, a morte física... O salário do nosso pecado foi uma situação de
morte, de infelicidade, de incoerência e tristeza, que culmina com a morte
física. Basta olhar o mundo ao nosso redor!
(2) Isto não significa que, se não tivéssemos pecado,
viveríamos aqui para sempre. Deus não nos criou para vivermos aqui indeterminadamente: “O
Senhor tirou o homem da terra e a ela faz voltar novamente. Deu aos homens um
número preciso de dias e tempo determinado” (Eclo 17,1s). Deus deu-nos um número preciso de dias, um tempo de
vida. Mas, uma coisa é certa: sem o pecado, vivendo na amizade com Deus e na
harmonia com os outros e com o mundo, a nossa morte não teria o gosto amargo de
morte. Se hoje a morte tem um aspecto trágico, é porque está ligada ao pecado,
ao nosso afastamento de Deus. Por isso a morte mete-nos medo e, muitas vezes, é
sentida como uma ameaça de cair no nada.
(3)
Mas, Deus não nos abandonou à morte: Ele enviou-nos
o seu Filho, em tudo igual a nós, menos no pecado. Ele tomou sobre si as nossas
dores, viveu a nossa vida mortal, de incertezas, de tristezas, de angústias, de
morte. Morrendo da nossa morte, Ele foi ressuscitado pelo Pai na força do
Espírito Santo. Morrendo da nossa morte, Ele deu-nos a possibilidade e a graça
de morrer como Ele e com Ele ressuscitar da morte: “Eu
sou a ressurreição! Quem crê em mim, ainda que esteja morto viverá!” (Jo
11,25). Desde o Baptismo, unidos a Cristo
morto e ressuscitado, alimentados pelo seu corpo e sangue na Eucaristia,
sabemos que “nem a morte nem a vida nem criatura alguma nos poderá
separar do amor de Cristo” (Rom 8,38s).
Esta é a nossa esperança: vivermos unidos
a Cristo já agora e, após a nossa morte, ressuscitar n’Ele e com Ele, n’Ele e
como Ele! Como o Senhor foi glorificado no seu corpo e na sua alma pela
potência do Espírito Santo, assim também nós seremos glorificados: logo após a
nossa morte, na nossa alma, nunca mais sentiremos o medo, a tristeza, a dor, o
pranto... e, no fim dos tempos, também no nosso corpo mortal seremos
glorificados: “semeado corruptível, ressuscitará corpo
incorruptível; semeado desprezível, ressuscitará reluzente de glória; semeado
na fraqueza, ressuscita cheio de força; semeado psíquico, ressuscita corpo
espiritual” (1Cor 15,42-44).
Sermos glorificados significa entrar na
plenitude de Cristo, na alegria de Cristo, na eternidade de Cristo! Isto, para
nós, é o Paraíso: estar para sempre com o Senhor!
Rezemos hoje pelos nossos queridos que já
morreram; rezemos por todos os fiéis que já partiram para Cristo: que recebam o
perdão dos seus pecados e entrem na plenitude de Deus.
A Sagrada Escritura diz que “é
um santo e piedoso pensamento rezar pelos mortos, para que sejam livres de seus
pecados” (Mc 2,12-46). Que o nosso carinho e a nossa saudade sejam
acompanhados pela nossa piedosa oração, cheia de esperança na ressurreição.
Mas, pensemos também na nossa vida, no
destino que estamos a dar à nossa existência, pois o nosso encontro com o
Senhor é preparado no dia-a-dia, nos pequenos momentos do nosso caminho neste
mundo. São Bernardo de Claraval afirmava que a nossa vida neste mundo é semente
á da eternidade. Pois bem! Estejamos atentos para viver de tal modo, que a nossa
vida seja uma amizade com Deus que começa aqui e se consumará na glória!
Voltemos o nosso olhar e o nosso
pensamento para Cristo, vencedor da nossa morte. As palavras do Prefácio da
eucaristia deste dia são tão consoladoras: Em Cristo “brilhou
para nós a esperança da feliz ressurreição. E, aos que a certeza da morte
entristece, a promessa da imortalidade consola. Senhor, para os que crêem em
vós, a vida não é tirada, mas transformada. E, desfeito o nosso corpo mortal,
nos é dado nos céus, um corpo imperecível”.
Que o Senhor realize a nossa esperança e
que nós vivamos de tal modo, que sejamos dignos dela!
Dai-lhes Senhor, o eterno Descanso!
Da luz perpétua, o resplendor!
Que as suas almas descansem em paz.
Assim seja!
HÉLDER GONÇALVES
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