Sabe-se que a Igreja encerra seu Ano Litúrgico com a Solenidade Nosso
Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo. No entanto, poucos se dão conta de que se
trata de uma festa relativamente recente, pois só foi instituída em 1925,
portanto há menos de cem anos.
Mas o que levou o papa Pio XI a dedicar a primeiríssima encíclica de
seu pontificado à criação de uma festa de Cristo Rei? (cf. carta encíclica
Quas primas, 11/12/1925).
No início do século XX, o mundo, que ainda estava a recuperar-se da
Primeira Guerra Mundial, fora varrido por uma onda de secularismo e de ódio à
Igreja, como nunca visto na história do Ocidente. O fascismo na Itália, o
nazismo na Alemanha, o comunismo na Rússia, a revolução maçónica no México,
anti-clericalismos e governos ditatoriais alastravam por toda parte.
É neste contexto que, sem medo de ser literalmente “politicamente
incorrecto”, o papa Pio XI institui uma festa litúrgica para celebrar uma verdade
da nossa fé: mesmo com ditaduras e perseguições à Igreja, Nosso Senhor Jesus
Cristo continua a reinar, soberano, sobre toda a história da humanidade.
Papa Pio XI |
Recordar que Jesus é Rei do Universo foi um gesto de coragem do Santo
Padre. Com as revoluções que se seguiram no fim do primeiro conflito mundial,
em 1917, o título de Cristo Rei tornara-se um tanto impopular. Se o Papa
tivesse exaltado Jesus como profeta, mestre, curador de enfermos, servo
humilde, vá lá! Qualquer outro título teria sido mais aceitável. Mas Cristo
Rei?!…
Mesmo assim, nadando contra a corrente e opondo-se ao secularismo ateu e anti-clerical,
o Vigário de Cristo na terra instituiu esta solenidade para nos recordar que
todas as coisas culminam na plenitude do Cristo Senhor: “Eu sou o Alfa e o
Ómega, o Princípio e o Fim de todas as coisas” (Ap 1, 8).
É necessário
reavivar a fé na restauração e na reparação universal realizadas em Cristo
Jesus, Senhor da vida e da história.
Com esta solenidade o Papa Pio XI esperava algumas mudanças no cenário
mundial: Que as nações reconhecessem que a Igreja dever estar livre do poder do Estado
(Quas primas, 32).
Que os líderes das nações reconhecessem o devido respeito e obediência a Nosso
Senhor Jesus Cristo (Quas primas, 31).
Que os fieis, com a celebração litúrgica e espiritual desta solenidade,
retomassem coragem e força e renovassem a sua submissão a Nosso Senhor, fazendo
com que ele reine nos seus corações, nas suas mentes, nas suas vontades e nos seus
corpos (Quas primas, 33).
Encerrar o Ano Litúrgico com a Solenidade de Cristo Rei é consagrar a
Nosso Senhor o mundo inteiro, toda a nossa história e toda a nossa vida. É
entregar à sua infinita misericórdia um mundo onde reina o pecado.
Pilatos pergunta a Jesus se ele é rei. O Nosso Salvador responde que o seu
Reino não é deste mundo. Ou seja, não é deste mundo “inventado” pelo homem e
pelo pecado: o mundo da injustiça, da escravidão, da violência, do ódio, da
morte e da dor. Ele é rei do Reino de seu Pai e, como rei-pastor, desde o alto
da cruz, guia a sua Igreja no meio das tribulações.
Sabemos que o Reinado de Cristo não se realizará por um triunfo
histórico da Igreja. É isto que nos recorda o Catecismo da Igreja Católica no
seu número 677. Mesmo assim, no final, haverá sem dúvida uma vitória de Deus
sobre o mal. Só que esta vitória acontecerá como acontecem todas as vitórias de
Deus: através da morte e da ressurreição. A Igreja só entrará na glória do
Reino se passar por uma derradeira Páscoa. A Esposa deve seguir o caminho do
Esposo.
É assim que, nesta festa, o manto vermelho de Cristo assinala a realeza
de Nosso Senhor, mas também recorda-nos o sangue de tantos mártires Cristãos da
nossa história recente. Foram fieis católicos que, ouvindo os apelos do
Sucessor de Pedro, não tiveram medo de entregar as suas próprias vidas e de
morrer aos brados de “viva Cristo Rei!”
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